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Channel: Masterclass: Época de Ouro do Cinema Americano (1930-1960)
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SESSÃO 45: 22 DE SETEMBRO DE 2014

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QUANTO MAIS QUENTE, MELHOR

(1959)



“Some Like It Hot “ assinala o reencontro de Billy Wilder com Marilyn (depois de “O Pecado Mora ao Lado”), agora num argumento de sua autoria e do seu parceiro habitual, I.A.L. Diamond, segundo história de Robert Thoeren e Michael Logan, que já dera um filme francês, em 1935, “Fanfare d'Amour”, de Richard Pottier. Curiosamente, a história estaria na base de um outro título, “Fanfaren der Liebe”, este alemão, assinado por Kurt Hoffmann, e de 1951. Mas a história de ambos não tinha a nada a ver com gangsters, ainda que vivesse essencialmente das mesmas situações dúbias de travestis e perseguições amorosas. O filme de Wilder foi-se chamando sucessivamente “Fanfares of Love” e “Not Tonight, Josephine” antes de assumir a designação definitiva.
Estamos em Chicago, em plena época do crime organizado, 1929. Um funeral abre a acção: caras patibulares conduzem um carro funerário e escoltam um caixão que atravessa Chicago durante a noite.  Depois, ouvem-se as sirenes da polícia que o persegue e segue-se a troca de tiros. Os patibulares rasgam o tecto do carro funerário e retiram metralhadoras. O caixão atingido começa a jorrar whisky pelos inúmeros orifícios. Sobre estas imagens uma legenda mais ou menos pleonástica: “Chicago: 1929”. Saltam à memória a Lei Seca, a época dourada do gangsterismo, com Al Capone à cabeça, a Grande Depressão que se iria seguir ao Crash de 1929, as rusgas da polícia, os massacres entre gangs rivais, de que se destacou o de St. Valentin, os bares clandestinos (aqui é uma agência funerária que serve de capa ao comércio clandestino de “café de malte”: “se temos de morrer, há lá melhor maneira de o fazer!”), e os congressos de fachada (“Os Amigos da Ópera Italiana”, a encobrir os quartéis da Máfia local). 

Estamos em pleno domínio do filme de gangsters, que nasce por essa altura. Spats Colombo (George Raft, um dos actores fetiches desse período), chefe de um grupo de gangsters, chacina um gang rival numa garagem, numa alusão clara ao tal celebrado massacre de St. Valentin. Dois músicos, Joe (Tony Curtis) e Jerry (Jack Lemmon), assistem a tudo e são perseguidos pelos gangsters. Para se resguardarem e conseguirem sair da cidade em segurança, vestem-se de mulher, passam a ser Josephine e Daphne, e integram uma banda musical composta só por mulheres, e onde se encontra a vocalista Sugar Kane Kowalczyk (Marilyn Monroe). Assim conseguem escapar para a Florida, numa acidentada viagem de comboio que, no entanto, não é nada comparada com o que lhes está reservado no futuro, sobretudo quando um excêntrico milionário, Osgood Fielding III (Joe E. Brown), se apaixona por Daphne e a persegue sem dar tréguas.
O filme de gangsters desloca-se para a comédia e para o musical. Os ambientes agora são os sofisticados hotéis da Florida, os gangsters aprumados, de impecáveis polainas brancas, são substituídos pelos velhos milionários em lêem jornais financeiros em filas de cadeiras de baloiço a olhar o mar e as beldades que passam, procurando encontrar entre elas mais uma noiva para acrescentar ao rol. Digamos que há dois mundos simétricos que se vão encontrar por obra e graça de uma orquestra feminina, que nem por isso é assim tão feminina.  

Esta comédia de equívocos, um dos melhores trabalhos de Billy Wilder, permite aos actores “tours de force” admiráveis, e aqui Marilyn consegue ter em Jack Lemmon e Tony Curtis parceiros à altura. Rodando tudo à volta da sexualidade, das suas aparências e dos seus embustes, do dito e do interdito, do hábito e do monge, do natural e do postiço, “Quanto Mais Quente Melhor” terá sido, por isso mesmo, por essa afronta declarada ao convencional e ao regrado, um dos filmes que maior importância terá tido na abolição do Código de Censura, em início dos anos 60, juntamente com “Psico”, de Hitchcock, ou de “Anatomia de um Crime”, de Preminger (entre outros). Recusando pedir o certificado que era exigido para a sua apresentação pública, Billy Wilder e os seus produtores ajudaram a esvaziar de significado esta exigência e a torná-la inútil.
Comédia de enganos em que quase ninguém é o que parece. Agências funerárias são bares, congressistas são gangsters, mulheres são homens, mas todos procuram lucro fácil e sexo. Dólares e orgasmos. Afinal, a base de todo o poder. Juntam-se gangsters e milionários, uma orquestra feminina de jazz e as perseguições intensificam-se, sempre na base do engano. Há uma sequência magnífica com “filages” que ligam duas situações que se desenrolam em locais diferentes, mas ambas com a mesma intenção: num iate, tomado por “empréstimo”, Sugar Kane procura seduzir Joe, que a deseja vivamente, mas se afirma muito traumatizado pelas mulheres, pelo que a sensual loura o beija sofregamente para reavivar a sua virilidade; numa esplanada, não muito longe dali, uma orquestra latino-americana, de olhos vendados, toca canções exóticas para o multimilionário Osgood Fielding III (Joe E. Brown) tentar levar à certa Daphne, trocando o par de flor nos lábios a cada rotação dos corpos. 

Os trocadilhos e os subentendidos fervilham, e há momentos de uma hilaridade contagiante, como quando Tony Curtis, na praia, homenageia o seu actor preferido, Gary Grant, copiando-lhe a voz e a pronúncia numa paródia excelente. Alias o gozo com algumas figuras ícones do cinema não se fica por aqui. O próprio George Raft, ao entrar para o “Congresso” depara-se com um aprendiz de gangster que atira uma moeda ao ar enquanto fala. Esta era uma das características de Rinaldo, personagem criada por Raft num dos mais memoráveis filmes de gangsters, “Scarface, o Homem da Cicatriz”, de Howard Hawks (1932). Raft não resiste a comentar a falta de jeito do novato.
Billy Wilder é brilhante, na primorosa direcção de actores, da definição de ambientes, desde o soturno submundo do crime de Chicago ao sofisticado universo da Florida, na forma como enquadra e encadeia situações, quase sempre sugerindo mais do que mostrando, jogando com a elipse de forma inteligente, e retratando de forma implacável uma época, mas, mais do que isso, a condição humana. Com uma ironia fina mostra-nos o essencial: “Ninguém é perfeito!”
Este é possivelmente o melhor filme de Marilyn. Sobre o seu trabalho com Billy Wilder, ela confessou: “Durante a rodagem Billy Wilder dizia por vezes: “Certos actores fazem e refazem a mesma cena, mas nada mais conseguem do que perder a espontaneidade”. Mas eu quando recomeço, sinto que me distendo um pouco mais e que posso ousar um pouco mais longe na próxima “take”. Sou um pouco tímida e neste caso não há nada a fazer. Não tenho audácia e não sei se adquirirei um dia alguma autoridade. Mas nem a audácia nem a autoridade me interessam particularmente. Preciso de encontrar um método de trabalho, uma maneira de utilizar completamente o meu jogo, quer ele seja bom, mau ou indiferente.” Em “Quanto Mais Quente, Melhor”, cuja rodagem terá sido tormentosa, o resultado é notável, a sua composição brilhante, inclusive ao nível do humor, e as três canções que interpreta (“I’m Through with Love”, de Gus Kahn, Matty Malneck e F. Livingston, “I Wanna Be Loved by You”, de Bert Kalmar, Harry Ruby e Herbert Stothart, e “Running Wild”, de Joe Gray e Leo Worth) são momentos inesquecíveis. 

Há sequências que ficam na história do cinema e que eternizam Marilyn, como a sua apresentação, na chegada a uma estação de caminhos-de-ferro, ondulando o corpo como só ela sabia fazer, desafiando o equilíbrio a cada passo, provocando o êxtase em todos quantos a vêem passar (e nos atónitos espectadores do filme), dando, no entanto, a ideia de que para ela isso é o mais natural e simples. Ao contrário dos atarantados Curtis e Lemmon, que experimentam pela primeira vez o que é andar de saltos altos. O filme ganha com a presença deste trio impagável, ajudando em muito este título a ser considerado uma das 10 melhores comédias de sempre da história do cinema. Em 2000, foi mesmo considerado pelo American Film Institut a melhor comédia de sempre. Para Billy Wilder era o seu filme preferido. 


QUANTO MAIS QUENTE, MELHOR
Título original: Some Like It Hot    
Realização: Billy Wilder (EUA, 1959); Argumento: Billy Wilder, I.A.L. Diamond, segundo Robert Thoeren e M. Logan (história); Música: Adolph Deutsch, Bert Kalmar, Leo Wood (Cançõe), A.H. Gibbs (Canção "Running Wild"), Matty Malneck (Canção "I'm Through With Love"), Herbert Stothart (Canção "I Wanna Be Loved By You") (não creditados); Fotografia (cor): Charles Lang; Montagem: Arthur P. Schmidt; Direcção artística: Ted Haworth; Decoração: Edward G. Boyle; Guarda-roupa: Orry-Kelly; Maquilhagem: Agnes Flanagan, Emile LaVigne, Alice Monte; Direcção de produção: Allen K. Wood; Assistentes de realização: Sam Nelson; Departamento de arte: Tom Plews; Som: Fred Lau, Eve Newman; Efeitos Especiais: Milt Rice, Daniel Hays; Produção: I.A.L. Diamond, Doane Harrison, Billy Wilder; Intérpretes:Marilyn Monroe (Sugar Kane Kowalczyk), Tony Curtis (Joe /Josephine/Júnior), Jack Lemmon (Jerry (Daphne), George Raft (Spats Colombo), Pat O'Brien (Mulligan), Joe E. Brown (Osgood Fielding III), Nehemiah Persoff (Little Bonaparte), Joan Shawlee (Sweet Sue), Billy Gray (Sig Poliakoff), George E. Stone (Toothpick Charlie), Dave Barry, Mike Mazurki, Harry Wilson, Beverly Wills, Barbara Drew, Edward G. Robinson Jr., Ted Hook, Al Breneman, Marian Collier, Pat Comiskey, Joan Fields, Mary Foley, Paul Frees, Joe Gray, Harold 'Tommy' Hart, John Indrisano, Tom Kennedy, Penny McGuiggan, Laurie Mitchell, Helen Perry, Fred Sherman, Tito Vuolo, Sandra Warner, Grace Lee Whitney, etc. Duração: 120 minutos; Distribuição em Portugal: M.G.M. (DVD); Classificação etária: M/12 anos; 


MARILYN MONROE (1926 – 1962)
De nome de baptismo chamava-se Norma Jean Mortensen, mas começou por ser conhecida por Norma Jean Baker. Nasceu a 1 de Junho de 1926, no Los Angeles General Hospital, em Los Angeles, Califórnia, EUA, e teve uma infância difícil. A mãe, Gladys Baker Monroe, chegou a trabalhar no cinema, como montadora de negativo, teve problemas psiquiátricos, chegou a estar presa várias vezes e vivia permanentemente em condições de quase penúria extrema. Morreu num asilo psiquiátrico, com o diagnóstico de esquizofrénica-paranóica, e há quem diga que matara com uma facada, a melhor amiga, Grace McKee. A mesma cujo marido terá abusado sexualmente de Norma Jean quando esta tinha apenas nove anos. Tudo isto são, porém, atoardas lançadas para o ar, pelo diz-se diz-se e nada de concreto as fundamenta. As recordações de infância não poderiam, no entanto, ser mais dramáticas.
Já a avó materna fora internada num hospício depois de ter tentado sufocar a neta com um travesseiro. Do pai, Norma Jean pouco soube e nenhuma certeza teve. Há quem fale num tal Edward Mortensen, que garantem ter sido padeiro e que morrera vítima de um acidente de viação, antes de Marilyn nascer. Mas um outro biógrafo afirma que este mesmo Mortensen morreu aos 81 anos, em Riverside, de um ataque de coração. Há quem assevere, todavia, que o pai era um amigo desse Edward, colega da mãe na Consolidated Film Industries, e que se chamava Charles Stanley Gifford. Quando o tentou encontrar, ainda no início da sua carreira, este mandou dizer pelo telefone que se tinha alguma reclamação a apresentar se dirigisse ao seu advogado. Mais tarde, no auge da sua fama, Gifford tentou a aproximação, mas Norma Jean recordou-lhe então esta conversa.
Atendendo à instabilidade emocional da mãe, e ao facto de esta ser mãe solteira, Norma Jeane foi para casa de uma família adoptiva, a do muito religioso (fundamentalista!) casal Albert e Ida Bolender. Foi aqui que viveu os primeiros sete anos da sua vida: “Eram terrivelmente severos… não era por mal… era a sua religião. Educaram-me com muita severidade.” Mas à severidade de uns correspondia a depravação de outros. Em Outubro de 1933, com as finanças mais equilibradas, Gladys passa a viver por algum tempo com a filha, Norma Jean. Em Setembro de 1935, com nove anos de idade, depois de ter sido (novamente?) violada (fala-se de um enigmático Mr. Kimmell, que poderia ter sido o actor inglês Murray Kinnell), foi para um orfanato, o Los Angeles Orphan’s Home, onde permaneceu até Junho de 1937, em condições relatadas por ela, dignas de um romance de Dickens. Jura que teve de lavar quantidades enormes de louça e se banhava em água suja, apanhava surras com escovas de cabelo e vivia infeliz: “Nessa altura, o mundo à minha volta era deprimente. Tive de aprender a fingir para… não sei… afastar a tristeza. O mundo todo parecia que me estava fechado… (Sentia-me) de fora de tudo e a única coisa que eu podia fazer era sonhar uma espécie de mundo de faz-de-conta.”
Em Setembro de 1941, Norma Jean, depois de várias outras peripécias, estava a viver com Grace McKee quando encontrou Jim Dougherty, cinco anos mais velho do que ela. Grace encorajou a relação entre ambos e, ao saber que ela e o marido iam mudar-se para a Costa Leste, tratou de tudo para Norma Jean casar com Dougherty no dia 19 de Junho de 1942: “Grace McKee arranjou-me o casamento, eu não tive alternativa. Não há muito a dizer acerca disso. Eles não me podiam sustentar e tinham que arranjar qualquer coisa. E foi assim que me casei.”
Compreende-se que, apenas com 16 anos, Norma Jean se case com Jimmy Dougherty, um jovem de 21 anos que conheceu quando trabalhava na Radio Plane, em Van Nuys, Califórnia, uma fábrica de construção de aeronaves. O casamento funcionou como uma forma de libertação, um escape. De pouca duração. Dougherty alistou-se na Marinha em 1943 e, no ano seguinte, foi enviado para a frente da batalha. Ela ficou. Divorciaram-se em Junho (ou Setembro?) de 1946: “O meu casamento não me fez infeliz, mas também não me fez feliz. O meu marido e eu mal nos falávamos. Não porque estivéssemos zangados. Mas não tínhamos nada para dizer um ao outro. Morria de aborrecimento.”
Antes, em 1944, Marilyn foi fotografada na fábrica de material militar por David Conover um repórter fotográfico. O Exército encomendara as fotos com o intuito de divulgar o papel e a contribuição das mulheres durante a guerra. O fotógrafo, que havia sido enviado nessa missão pelo capitão Ronald Reagen, pediu permissão para fazer mais fotos e Marilyn dava início à sua carreira de modelo. Emmeline Snively, directora do “Blue Book Modeling Agency” ficou entusiasmada com o que viu e contratou-a como modelo. Cinco dólares por hora. A primeira capa foi a de “Family Circle”, aparecida a 26 de Abril de 1946. No ano seguinte, a beleza de Norma Jean tornou-se imensamente popular, sendo capa de 33 das revistas mais famosas. Entretanto, deixara o trabalho na fábrica e assume a tempo inteiro uma carreira de modelo. O seu fito é, no entanto, chegar ao cinema. 

O sucesso como modelo fotográfico leva a 20th Century-Fox a contratá-la, em 1946. Foi Howard Hughes quem a notou antes e lhe propôs uns testes. Zanuck, o patrão da Fox, não estava muito inclinado sequer para o teste, mas quando o viu ficou entusiasmado e Marilyn assina um contrato de 75 dólares por semana (admitamos como certa esta importância!). Billy Wilder mais tarde diria que Zanuck ficou particularmente tentado pelo “impacto sensual”, e acrescentou: “Há raparigas que têm uma pele que parece viver na fotografia. Temos a impressão de que as podemos tocar.” Norma Jean era uma delas. Pouco depois, e por sugestão da Fox (dizem que por sugestão de Bent Lyon), Norma Jean começou a assinar o nome Marilyn Monroe. Monroe vem da sua mãe e Marilyn da actriz Marilyn Miller.
A primeira aparição de Marilyn foi numa pequena cena, em 1947, no filme "The Shocking Miss Pilgrim". Seguiu-se-lhe “Scudda Hoo! Scudda Hay!” onde a sua contribuição a nível de diálogo se resumia a um “Hi!”, ainda assim cortado na montagem definitiva. “Dangerous Years” mostra-a num grande plano, o que não foi suficiente para a Fox manter o contrato. Dispensada, foi para à Columbia, em cujo primeiro filme, “Ladies of the Chorus”, interpreta a personagem secundaríssima da “strip-teaser” Peggy Martin, que canta a famosa canção “Every Baby Needs a Da-Da-Daddy”, que mereceu as primeiras referências críticas a Marilyn Monroe aparecidas na imprensa, a 23 de Outubro de 1948, numa das páginas do “Motion Pictures Herald”: ”Uma das prestações mais brilhantes é a de Miss Monroe. Ela é bonita e tem uma voz e um estilo encantadores e prometedores.”  
Mas também a Columbia não ficou entusiasmada com o concurso de Marilyn, e foi de novo dispensada, depois de algumas outras curtas aparições. Voltou a trabalhar como modelo, até que respondeu a um anúncio para um papel num filme que seria o último dos Irmãos Marxs: “Love Happy”. Ela recorda o episódio: “Éramos três e Groucho pedia a cada uma para dar alguns passos à sua frente. Eu fui a única que ele pediu para recomeçar, segredando-me antes ao ouvido: “Tu tens o mais belo rabo da profissão!” Era um cumprimento, não uma grosseria.” Uma cena de minuto e meio, e foi tudo.
Continuou a representar pequenos papéis, mas surge então (1949) uma personagem que irá ter algum significado na vida de Marilyn, Johnny Hyde, agente da William Morris Agency e rapidamente seu amante, que encontra numa recepção em Palm Springs e que se mostra entusiasmado com o futuro da prometedora actriz. Hyde está profundamente apaixonado por Marilyn, propõe-lhe casamento. Ela recusa, apesar da fortuna que poderia herdar rapidamente. Hyde estava gravemente doente do coração, explica-lhe que terá pouco tempo de vida, mas Marilyn confessa-lhe que “tem muita afeição por ele, que o acha um homem delicado, meigo, brilhante, um amigo querido, mas que não está apaixonada.” Depois da morte de Hyde, diz que “passou noites e noites a chorar. Por vezes recriminava-me por ter recusado aquele casamento. Mas ao mesmo tempo sabia que agiria mal se tivesse casado com alguém que não amava. Um milhão de dólares não me inspira nenhum remorso. Mas Johnny Hyde continua a fazer-me falta.” A família do defunto pede-lhe para não ir ao enterro. Mas ela vai.
É ainda em 1949 que Marilyn aceita posar nua para um calendário, facto que mais tarde irá acarretar inúmeras críticas e contestação, quando a actriz era já uma vedeta, o que lhe valeu uma réplica célebre: “Hollywood é um lugar onde te pagam mil dólares por um beijo e cinquenta cêntimos pela tua alma.” Na verdade, a foto de Tom Kelley deu-lhe 50 dólares a ganhar e conseguiu um lucro de mais de 750.000.
Foi Johnny Hyde quem, em 1950, chamou a atenção do realizador John Huston para Marilyn. Ele viu uma das suas “aparições” no ecrã e resolve dar-lhe uma oportunidade de maior relevo em "Asphalt Jungle", depois de um teste lendário: Marilyn aparece com os peitos reforçados por “kleenexs” para causar melhor impressão, John Huston, ele próprio, alivia-a desses apêndices e diz-lhe para ela “passar o texto”. Marilyn pede para se deitar no chão, pois a cena seria passada numa cama, e não se cansa de repetir a “deixa”. Será Huston a mandá-la calar, dizendo “Basta, o papel é teu. Aparece segunda-feira no estúdio às nove horas.” Será a “sobrinha” de Louis Calhern, um advogado corrupto num grupo de “gansgters”, que ela atraiçoa, neste “filme negro” que se tornou um clássico do género.
Esta obra abre-lhe as portas para novas oportunidades, cada vez mais influentes. O seu desempenho em "All About Eve", também em 1950, gerou alguma notoriedade, e ficou a dever-se ao facto de Joseph L. Mankiewicz a ter visto em “Quando a Cidade Dorme”. Nesta obra-prima que aborda o universo do cinema, Marilyn é uma jovem estudante de arte dramática e aparece ao lado de nomes consagrados como os de Bette Davis, Anne Baxter, George Sanders, Gary Merrill ou Celeste Holm. Quem a viu nos primeiros dias de filmagens percebeu o terror em que a mesma vivia. Chegava com horas de atraso ao estúdio, não conseguia fixar uma linha de texto, obrigava cada plano a ser filmado para cima de vinte vezes. Seria o início de um longo calvário (que se iria prolongar nos mesmos termos até ao fim da sua carreira) para os realizadores, produtores e colegas actores que consigo contracenavam, mas seria igualmente um pesadelo para a própria Marilyn, vítima da insegurança e da fragilidade psicológica de uma Norma Jean nunca amada, nunca desejada como pessoa, apenas cobiçada como corpo erótico para satisfação de sonhos de homens (e mulheres) que viam nela apenas um objecto sexual facilmente descartável depois de utilizado.
Toda a vida de Marilyn parece evoluir entre duas realidades psicológicas contraditórias: por um lado a necessidade de ser desejada a todo o preço, de se sentir cortejada, adulada, nem que para tal se tenha de converter num mero “sex symbol” de uma geração (ou de várias); por outro lado, a imperiosa exigência de romper com esse estatuto de mulher-brinquedo, loura e desmiolada, apenas desejada pelo seu busto, o seu andar, a generosidade da sua sensualidade explosiva. Neste caso, Marilyn pretendia acima de tudo ser olhada como mulher, como actriz, como alguém que pensa e sente, que lê bons livros e é capaz de ser amada por um dos mais prestigiados escritores norte americanos do seu tempo (Arthur Miller, vítima de perseguições durante o “machartismo”, e a quem Marilyn soube apoiar nos momentos de crise), ou pelos presidenciáveis Kennedys. Esta duplicidade de desejo nunca resolvida, este esboço de esquizofrenia latente, ficou marcada no seu corpo pelas mãos dos mais importantes homens da América, desde presidentes a escritores, de produtores a cantores, de actores a realizadores, de agentes a multimilionários.
Marilyn queria ser a um tempo “maravilhosa” e/ou “apenas uma mulher” e uma “boa actriz”. O espantoso, porém, e talvez seja essa a razão maior da criação de um mito que nada irá apagar nunca, é a permanência de uma inocência inatacável no seu olhar, a fragilidade doce e etéreo de um corpo que todos desejam e ninguém parece macular. Para lá de todas as feridas que os anos vão acumulando, a sua pele continua “a apetecer ser tocada”, tal como uma deusa misteriosa de desígnios insondáveis. O mito nasce.
"Clash By Night", de Fritz Lang, em 1952, merece igualmente boas referências da crítica, como a assinada por Alton Cook, no “New York World-Telegram and Sun” que dizia: "a forceful actress, a gifted new star, worthy of all that fantastic press agentry. Her role here is not very big, but she makes it dominant."
Marilyn conhece Joe DiMaggio no início de 1952, ela tem 25 anos, ele 37. DiMaggio tinha-se retirado do “baseball” norte-americano, concluindo uma carreira de astro. Há tempos que manifestara o desejo de conhecer a sua actriz preferida e em Fevereiro desse ano o romance explode nas páginas das revistas. “Fiquei surpreendida por me apaixonar de tal maneira por Joe, disse Marilyn. Esperava que ele fosse do género do desportista flamejante de Nova Iorque, e em vez disso deparei com um tipo reservado que não se atirou a mim logo imediatamente. Joe é um homem muito decente que faz as outras pessoas sentirem-se decentes também.”
1952 marca ainda pontos na carreira cinematográfica de Marilyn, que filma "Niagara", de Henry Hathaway, com Joseph Cotten, uma obra que ajuda a consolidar o seu estatuto de vedeta. "Gentlemen Prefer Blondes", de Howard Hawks, é o título seguinte, que a reúne a Jane Russell. Ambas irão assinar e deixar as marcas de mãos e pés no cimento que fica no passeio em frente ao Chinese Theatre, em Hollywood Boulevard. Este tinha sido o local que Marilyn havia visitado quando criança, acompanhada pela mãe e pela amiga Grace. Tinha sido ali que havia jurado a si própria: “Quero ser uma grande estrela para lá de tudo o resto!" Conseguira-o.
Em 14 de Janeiro de 1954, Marilyn casa-se pela segunda vez, desta feita com Joe DiMaggio. Apenas nove meses depois, a 27 de Outubro de 1954, divorciaram-se. O advogado de Marilyn explicou em conferência de imprensa que o motivo da separação foi “um conflito entre de carreiras”. Ou apenas mais um equivoco.
A celebridade da actriz é total e isso mesmo fica demonstrado na visita que Marilyn Monroe faz às tropas americanas deslocadas na Coreia. São 60.000 mil militares em estado de completa euforia que a recebem em apoteose.
Após participar em vários filmes como apenas mais um belo rosto de Hollywood, Marilyn Monroe estava pronta para transformar a sua imagem através de uma séria actuação profissional. Queria deixar os papéis de tontinha e interpretar Dostoievski. Em 1956, Marilyn parte para Nova Iorque e dá início aos seus estudos sob a direcção de Lee Strasberg, no Actors Studio, uma casa que formara Marlon Brando, James Dean ou Paul Newman, entre tantos outros. Nesse mesmo ano, junto com o fotógrafo Milton Greene, Marilyn lançou a “Marilyn Monroe Productions”, uma produtora que irá intervir na concretização de alguns projectos futuros, como "Bus Stop", de Joshua Logan (1956) e "The Prince and the Showgirl", de Laurence Olivier (1957). Em ambos os filmes ficam documentados os progressos da actriz em importantes papéis que exigem mais do que um rosto bonito e um corpo escultural. Em Londres, com Laurence Olivier como actor e realizador, Marilyn protagoniza um dos episódios mais desequilibrados da sua carreira, chegando sempre ao estúdio fora de horas e provocando a ira de Olivier. Tudo indica que será a partir desta época que a sua instabilidade psicológica se agrava.
No dia 29 de Junho de 1956, depois de vários casos sentimentais, amplamente testemunhados pela imprensa de coração de todo o mundo, Marilyn Monroe casa com o dramaturgo Arthur Miller.
Entretanto, Billy Wilder, outro dos grandes cineastas norte-americanos, ainda que de origem europeia (austríaco), o que lhe confere um tipo de humor diferente, mais adulto e cínico, dirige Marilyn em duas das suas melhores comédias, “The Seven Year Itch” (1955) e, sobretudo, “Some Like it Hot” (1959). Em 1960, outro mestre americano, George Cukor, realiza “Let’s Make Love”, onde Marilyn contracena com Yves Montand e nova situação explosiva se insinua durante a rodagem. A proximidade de Montand e Monroe não deixa ninguém indiferente, a começar pelos próprios. Durante as filmagens, Arthur Miller parte subitamente para o Nevada, deixando o par de actores entregue ao seu romance. Explosivo. Yves Montand acabado o filme regressa a Paris e à sua mulher, a actriz Simone Signoret. Marilyn sofre novo abalo.
O filme "The Misfits", último trabalho terminado da actriz, é escrito propositadamente por Miller para Marilyn, colocando-a ao lado de Clark Gable, que desde a infância, era o seu actor preferido e o homem que ela gostaria de ter tido como pai, ou algo mais. Tudo indica que Marilyn teria um problema edipiano mal resolvido, e toda a sua vida emocional e sexual parece ser uma longa procura do pai que nunca teve. Não será necessário ser um psiquiatra muito atento para inferir desta vida consumida em excessos uma conclusão destas. Um conjunto invulgar de episódios trágicos marca “Os Inadaptados”, que mantinha constantemente em estúdio, durante as filmagens, médicos para acompanharem quer Marilyn Monroe quer Montgomery Clift.
Em Agosto de 1960, Marilyn é hospitalizada e as filmagens suspensas. Retomadas pouco depois, são concluídas em 4 de Novembro. A 11 do mesmo mês anuncia-se a separação de Marilyn e Miller e a 16, Clark Gable morre vítima de um ataque cardíaco. Marilyn é acusada por Kay Gable, mulher do actor, de ter sido a causa da sua morte. O casamento entre Miller e Marilyn teve fim com o divórcio de 20 de Janeiro de 1961. Em Fevereiro, Marilyn tenta suicidar-se atirando-se de uma janela, mas fracassa nos seus intentos, sendo internada novamente numa clínica psiquiátrica de Nova Iorque. A dependência de drogas e do álcool acentua-se dramaticamente.
Em 1962, Marilyn foi considerada a estrela mais popular do mundo ("World's Most Popular Star") pelo Globo de Ouro (Golden Globe), demonstrando a sua fama e o reconhecimento internacional. No dia 5 de Agosto do mesmo ano, com apenas 36 anos de idade, Marilyn Monroe morreu enquanto dormia, na sua casa de Brentwood, Califórnia. Tinha o telefone a seu lado. Uma dose excessiva de barbitúricos foi a causa apontada na autópsia. Mas a sua morte continua envolta em mistério. Fala-se em assassinato. O seu romance com os Kennedys vem à baila.
O envolvimento com John F. Kennedy iniciara-se em finais de 1961. Na gala da celebração do aniversário do Presidente, no Madison Square Garden, a 6 de Maio de 1962, Marilyn canta o famoso "Happy Birthday To Mr. President” Também Bobby Kennedy ficou ligado a Marilyn com a suspeita de um “affair” numa data já muito próxima da sua morte. Por tudo isto, há quem fale de um silenciamento para impedir a revelação de algo comprometedor para alguém envolvido emocional e sexualmente com a actriz. O seu corpo foi sepultado no Westwood Memorial Park, em Los Angeles, Corridor of Memories, 24.
Deixou atrás de si trinta filmes, entre os quais um, inacabado, "Something's Got to Give". “Sei que pertenço ao público e ao mundo, não porque seja especialmente talentosa e bela, mas porque nunca pertenci a nada ou ninguém mais.”

Filmografia:
Como actriz
1947: The Shocking Miss Pilgrim (Sua Alteza a Secretária), de George Seaton
1947: Dangerous Years, de Arthur Pierson
1948: Scudda Hoo! Scudda Hay! ou Summer Lightning (Encanto da Mocidade), de F. Hugh Herbert
1948: Ladies of the Chorus, de Phil Karlson
1950: Love Happy ou Kleptomaniacs (Loucos por Mulheres), de David Miller, Leo McCarey (não creditado)
1950: A Ticket to Tomahawk, de Richard Sale
1950: The Asphalt Jungle (Quando a Cidade Dorme), de John Huston
1950: All About Eve (Eva), de Joseph L. Mankiewicz
1950: The Fireball ou The Challenge, de Tay Garnett
1950: Right Cross (Por um Amor), de John Sturges
1951: Home Town Story, de Arthur Pierson
1951: As Young as You Feel (Tão Jovem Quanto Possível), de Harmon Jones (TV)
1951: Love Nest (Um Ninho de Amor), de Joseph M. Newman (TV)
1951: Let's Make It Legal (Reconciliação), de Richard Sale (TV)
1952: Clash by Night (Conflito Nocturno), de Fritz Lang
1952: We're Not Married! (Não Estamos Casados), de Edmund Goulding
1952: Don't Bother to Knock (Os Meus Lábios Queimam), de Roy Ward Baker
1952: Monkey Business (A Culpa Foi do Macaco), de Howard Hawks
1952: O. Henry's Full House (Páginas da Vida), de Henry Hathaway, Howard Hawks, Henry King, Jean Negulesco e Henry Koster (episódio "The Cop and the Anthem", com Marilyn Monroe) 
1953: Niagara (Niagara), de Henry Hathaway
1953: Gentlemen Prefer Blondes (Os Homens Preferem as Loiras), de Howard Hawks
1953: How to Marry a Millionaire (Como se Conquista um Milionário), de Jean Negulesco
1954: River of No Return (Rio sem Regresso), de Otto Preminger e Jean Negulesco (este não creditado)
1954: There's No Business Like Show Business (Parada de Estrelas), de Walter Lang
1955: The Seven Year Itch (O Pecado Mora ao Lado), de Billy Wilder
1956: Bus Stop (Paragem de Autocarros), de Joshua Logan
1957: The Prince and the Showgirl (O Príncipe e a Corista), de Laurence Olivier
1959: Some Like It Hot (Quanto Mais Quente, Melhor), de Billy Wilder
1960: Let's Make Love ou The Millionaire (Vamo-nos Amar), de George Cukor
1961: The Misfits (Os Inadaptados), de John Huston  
1962: Something's Got to Give, de George Cukor (inacabado)

TONY CURTIS (1925-2010)
Tony Curtis, nome artístico de Bernard Schwartz, nasceu a 3 de Junho de 1925 em Nova Iorque, EUA, e faleceu a 29 de Setembro de 2010, com 85 anos, em Las Vegas, Nevada, EUA. Filho de um alfaiate húngaro imigrante, teve uma infância difícil no bairro do Bronx, em Nova Iorque. A mãe e um dos seus dois irmãos eram esquizofrénicos, o que fez com que ele e o outro irmão fossem internados num orfanato aos oito anos de idade, por impossibilidade do pai de tomar conta de todos. Fez o serviço militar na Marinha durante a II Guerra Mundial e assistiu à rendição japonesa na Baía de Tóquio, em 1945. De regresso aos EUA, estudou teatro, e, em 1948, em parte devido à sua bela aparência e ao sugestivo olhar, que o tornariam ídolo do público feminino nos anos seguintes, foi contratado pela Universal, viajando para Hollywood, onde teve aulas de esgrima e equitação e passou a assinar como Tony Curtis. O seu primeiro papel importante aconteceu em “Winchester '73”, de Anthony Mann. Foi quase sempre apenas considerado um "menino bonito", mas a verdade é que possuía talento que testemunhou em várias obras, sempre que puxavam por ele e o dirigiam com eficácia. Documentam-no filmes como “Sweet Smell of Success”, “The Defiant Ones”, “Boston Strangler”, “Trapeze”, “The Vikings”, “Operation Petticoat”, “The Rat Race”, “Spartacus”, “The List of Adrian Messenger”, “Paris, When It Sizzles”, “Goodbye Charlie”, “Sex and the Single Girl”, “The Great Race” ou “Boeing Boeing”, mas sobretudo “Some Like It Hot”, ao lado de Marilyn Monroe e Jack Lemmon. Trabalhou igualmente bastante na televisão (“The Persuaders, com Roger Moore, foi uma série bastante popular no início dos anos 70). O seu final de carreira como actor foi penoso, aparecendo em filmes muito medíocres. Nos anos 80, enveredou pela pintura, com algum sucesso. Tem um dos seus trabalhos exposto no Metropolitan Museum of Art de Nova York. Nunca ganhou um Oscar, mas foi nomeado pela sua participação em “Os Audaciosos” (The Defiant Ones, 1958). Tem uma estrela no Walk of Fame, em Hollywood Boulevard.
Casado seis vezes e teve seis filhos: Janet Leigh (1927 - 2004), Christine Kaufmann (1963 – 1967), Leslie Allen (1968 – 1982), Andrea Savio (1984 – 1992), Lisa Deutsch (1993 – 1994) e Jill Vandenberg Curtis (1998 - 2010). A actriz Jamie Lee Curtis (nascida em 1958) é filha do seu primeiro casamento.

Filmografia:
Como actor
1949: City Across the River (A Escola da Rua), de Maxwell Shane
1949: The Lady Gambles (A Tentação do Jogo), de Michael Gordon
1949: Criss Cross (Dupla Traição), de Robert Siodmak
1949: Take One False Step, de Chester Erskine (cenas eliminadas).
1949: Johnny Stool Pigeon (Johnny, o Denunciante), de William Castle.
1949: How to Smuggle a Hernia Across the Border, de Jerry Lewis
1950: Woman in Hiding (A Mulher Perseguida), de Michael Gordon
1950: Francis (Francis, o Macho que Fala), de Arthur Lubin.
1950: I Was a Shoplifter (Passei por Cadastrada), de Charles Lamont
1950: Sierra (O Segredo da Montanha), de A. E. Green
1950: Winchester '73 (Winchester '73), de Anthony Mann
1950: Kansas Raiders (Os Cavaleiros da Bandeira Negra), de Ray Enright
1951: The Prince Who Was a Thief (O Príncipe Ladrão), de Rudolph Maté
1952: Meet Danny Wilson (Ritmo da Vida), de Joseph Pevney (part. especial)
1952: Flesh and Fury (Dupla Vitória), de Jerry Hooper
1952: No Room for the Groom (O Noivo não tem Quart), de Douglas Sirk
1953: Houdini (Houdini, o Grande Mágico), de George Marshall
1953: Son of Ali Baba (O Filho de Ali Babá), de George Marshall
1953: Beachead (Fugitivos do Inferno), de Stuart Heisler
1953: The All-American, de Jesse Hibbs
1953: Forbidden (Amor Proíbido), de Rudolph Maté 
1954: The Black Shield of Falworth (O Escudo Negro), de Rudolph Maté
1954: Johnny Dark (Demónios Sobre Rodas), de George Sherman
1955: Six Bridges to Cross (A Ponte do Destino), de Joseph Pevney
1955: So This Is Paris (Isto é Paris), de Richard Quine
1955: The Purple Mask (O Máscara Vermelha), de H. Bruce Humberstone
1955: The Rawhide Years (Anos de Violência), de Rudolph Maté
1955: The Square Jungle (Dez Segundos de Silêncio), de Jerry Hooper
1956: Trapeze (Trapézio), de Carol Reed
1957: Mister Cory (Mister Cory), de Blake Edwards
1957: Sweet Smell of Success (Mentira Maldita), de Alexander Mackendrick
1957: The Midnight Story (O Segredo do Culpado), de Joseph Pevney
1958: The Vikings (Os Vikings), de Richard Fleischer
1958: The Defiant Ones (Os Audaciosos), de Stanley Kramer
1958: Kings Go Forth (Só Ficou a Saudade), de Delmer Daves
1958: The Perfect Furlough (Um Solteiro em Paris), de Blake Edwards
1959: Some Like It Hot (Quanto Mais Quente, Melhor), de Billy Wilder
1959: Operation Petticoat (Manobras de Saias), de Blake Edwards
1960: Who Was That Lady? (Quem Era Aquela Garota?) de George Sidney
1960: Spartacus (Spartacus), de Stanley Kubrick
1960: Pepe (Pepe), de George Sidney (cameo)
1960: The Rat Race (A Pousada das Ilusões), de Robert Mulligan
1961: The Outsider, de Daniel Mann
1961: The Great Impostor (O Mestre Impostor), de Robert Mulligan
1962: Tarass Boulba (Taras Bulba), de J. Lee Thompson
1962: 40 Pounds of Trouble (40 Quilos de Sarilhos), de Norman Jewison
1963: The List of Adrian Messenger (As Cinco Caras do Assassino), de John Huston
1963: Captain Newman, M.D., (O Combate do Capitão Newman), de David Miller
1964: Goodbye Charlie (Quando Ele era Ela), de Vincente Minnelli
1964: Sex and the Single Girl (A Solteira e o Atrevido), de Richard Quine
1964: Paris, When It Sizzles (Quando Paris Delira), de Richard Quine (part. especial)
1964: Wild and Wonderful (O Meu Rival), de Michael Anderson
1965: The Flintstones – episódio “The Return of Stony Curtis” (voz)
1965: The Great Race (A Grande Corrida à Volta do Mundo), de Blake Edwards
1965: Boeing Boeing (Boeing Boeing), de John Rich
1966: Not with My Wife, You Don't! (Com a Minha Mulher Não), de Norman Panama
1966: Arrivederci, Baby! (A Minha Última Condessa), de Ken Hughes
1966: Chamber of Horrors (O Estrangulador de Baltimore), de Hy Averback (part. especial)
1967: Don't Make Waves (Não Faças Ondas), de Alexander Mackendrick
1968: Rosemary's Baby (A Semente do Diabo), de Roman Polanski (voz) (não creditado)
1968: The Boston Strangler (O Estrangulador de Boston), de Richard Fleischer
1968: On My Way to the Crusades, I Met a Girl Who... (O Cinto da Castidade), de Pasquele Festa Campanile
1969: Those Daring Young Men in Their Jaunty Jalopies ou Monte Carlo or Bust (Os Gloriosos Calhambeques), de Ken Annakin
1969: Bracken's World (série de TV)
1970: You Can't Win 'Em All (Nem Sempre se Pode Ganhar), de Peter Collinson
1970: Suppose They Gave a War and Nobody Came? (Guerra de Malucos), de Hy Averback
1970: Les Baroudeurs
1971-1972: The Persuaders! (Os Persuasores) (série de TV)
1973: Shaft (série de TV)
1973: The Third Girl from the Left (telefilme)
1974: Mission: Monte Carlo (A Vingança de Monte Cristo) (telefilme)
1975: Lepke (Lepke, o Assassino), de Menahem Golan
1975: The Count of Monte Cristo (A Vingança de Monte Cristo), de David Greene
1975: The Big Rip-Off (telefilme)
1975-1976: McCoy (série de TV)
1976: London Conspiracy, de David Greene e James Hill
1976: The Last Tycoon (O Grande Magnate), de Elia Kazan
1976: Casanova & Co. (As 13 Mulheres de Casanova), de Franz Antel
1978: The Users (telefilme)
1978: Electric Light Orchestra Out of the Blue: Live at Wembley, de Mike Mansfield
1978: The Bad News Bears go to Japan, de John Berry
1978: The Manitou (Manitú) de William Girdler
1978: Sextette (América Louca), de Ken Hughes
1978-1981: Vega$ (série de TV)
1979: Title Shot, de Les Rose
1979: It Rained All Night the Day I Left (Os Alegres Aventureiros), de Nicholas Gessner
1980: Little Miss Marker (Jogar para Ganhar), de Walter Bernstein
1980: The Mirror Crack'd (Espelho Quebrado), de Guy Hamilton
1980: Moviola: The Scarlett O'Hara War (telefilme)
1981: Inmates: A Love Story (Romance na Prisão), de Guy Green (telefilme)
1981: The Million Dollar Face (telefilme)
1982: Othello, the Black Commando, de Max H. Boulois
1982: Portrait of a Showgirl (telefilme)
1983: Brainwaves, de Ulli Lommel
1983: Where is Parsifal? de Henri Helman
1983: The Fall Guy (série de TV)
1985: The Fantasy Film Worlds of George Pal (documentário)
1985: Insignificance (Uma Noite Inesquecível), de Nicolas Roeg
1986: Tragédia em Três Actos (telefilme)
1986: Banter ou The Last of Philip Banter, de Hervé Hachuel
1986: Club Life, de Norman Thaddeus Vane
1986: Mafia Princess, de Robert L. Collins (telefilme)
1986: Balboa, de James Polakof
1986: Murder in Three Acts (Tragédia em Três Actos), de Gary Nelson
1987: Sparky's Magic Piano (curta-metragem) (voz)
1988: Der Passagier - Welcome to Germany ou The Passenger - Welcome to Germany, de Thomas Brasch
1989: Midnight, de Norman Thaddeus Vane
1989: Tarzan in Manhattan, de Michael Schultz (telefilme)
1989: Walter & Carlo In America, de Jarl Friis-Mikkelsen e Ole Stephensen
1989: Lobster Man from Mars (Os Loucos Invasores do Espaço), de Stanley Sheff
1989: Charlie (telefilme)
1990: Thanksgiving Day (telefilme)
1991: Prime Target, de David Heavener e Phillip J. Roth
1992: Center of the Web, dev David A. Prior
1992: Hugh Hefner: Once Upon a Time (documentário)
1992: Christmas in Connecticut (Um Natal em Connecticut) de  Arnold Schwarzenegger (telefilme)
1992: Hollywood Babylon II (documentário)
1993: The Mummy Lives, de Gerry O'Hara
1994: Naked in New York, de Daniel Algrant
1994: A Century of Cinema (documentário)
1994: A Perry Mason Mystery: The Case of the Grimacing Governor (telefilme)
1994: Bandit: Beauty and the Bandit (telefilme)
1995: The Celluloid Closet (documentário)
1995: The Immortals (Imortais à Solta), de Brian Grant
1995: Hardball, de George Erschbamer
1996: Roseanne (série de TV)
1996: Lois & Clark: The New Adventures of Superman (série de TV)
1997: Brittle Glory, de Stewart Schill
1997: Elvis Meets Nixon, de Allan Arkush                   
1997: Alien X Factor, de Ulli Lommel
1998: Stargames, de Greydon Clark
1998: Louis & Frank, de Alexandre Rockwell
1998: Suddenly Susan (série de TV)
1999: Play It to the Bone, de Ron Shelton (part. especial)
2002: Reflections of Evil, de Damon Packard (narrador)
2004: Hope & Faith (série de TV)
2005: 8 Simple Rules (série de TV)
2005: CSI: Crime Scene Investigation (série de TV)
2006: Where's Marty?, de Nola Rocco
2007: The Blacksmith and the Carpenter, de  Chris Redish (curta-metragem) (voz)
2008: David & Fatima, de Alain Zaloum
2008: The Jill & Tony Curtis Story, de Ian Ayres (tema de documentário)
2013: Morella, de Adam Ropp (em produção)

SESSÃO 46: 29 DE SETEMBRO DE 2014

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ANATOMIA DE UM CRIME (1959)
“Anatomia de um Crime” (Anatomy of a Murder), de Otto Preminger, baseia-se num romance de Robert Traver, pseudónimo de John D. Voelker More que, sendo juiz na época em que escreveu a obra, a assinou com um nome suposto para assim não comprometer a sua carreira profissional, tanto mais que tinha sido ele o advogado de defesa do caso verídico sobre o qual se baseava a suposta ficção. Parece que o grosso volume de “Anatomy of a Murder” andou de mão em mão entre secretárias de diversos editores, até que um se aventurou a publicá-lo, ganhando com isso um “best seller” de reputação incomparável. Este não foi o único policial tendo como cenário um tribunal. John Donaldson Voelker, algumas vezes sob o pseudónimo de Robert Traver, foi um fecundo escritor, entre início da década de 50 e a de 80: "Danny and the Boys" (1951), "Small Town D.A." (contos, 1954), "Anatomy of a Murder" (1958), "Trout Madness" (contos, 1960), "Hornstein's Boy" (1962), "Anatomy of a Fisherman" (uma não ficção, 1964), "Laughing Whitefish" (1965), "The Jealous Mistress" (1967), "Trout Magic" (contos, 1974) e, finalmente, "People Versus Kirk" (1981).
Nascido a 29 de Junho de 1903, em Ishpeming, no Michigan, EUA, viria a falecer de ataque cardíaco, aos 87 anos, no dia 18 de Março de 1991, em Marquette, no Michigan, onde foi juiz no Supremo Tribunal Estatal, entre 1956 e 1960. 
Como já dissemos, o texto baseava-se num caso verídico, ocorrido numa pequena cidade, Big Bay, no Michigan. Relata-se em poucas palavras: no dia 31 de Julho de 1952, o tenente Coleman Peterson, recentemente regressado da Coreia, matara a tiro Mike Chenoweth, dono de um bar, alegadamente por este ter violado a sua mulher, Charlotte. O advogado de defesa, John D. Voelker, alegou insanidade temporária do militar, o que acabaria por o libertar, dado ainda um psiquiatra testemunhar que se tinha curado e não apresentava ameaça de perigo. Parece que, depois de bem defendido por Voelker, e livre de apertos jurídicos, o tenente Coleman Peterson deixou a cidade sem sequer pagar os honorários devidos ao seu advogado.
Neste aspecto, o filme de Otto Preminger, que contratou John D. Voelker como consultor técnico, foi o mais fiel possível, não só ao romance como ao ambiente onde decorreu e às personagens que viveram o drama. Todo o filme foi rodado no Estado do Michigan, na zona de Ishpeming-Marquette, o que permitiu ao realizador uma liberdade de movimentos invulgar, sem a presença de controleiros da produtora. O hotel local serviu de base de apoio, onde havia camarins, salas para a fotografia, a montagem, a maquilhagem, etc. O tribunal e a prisão serviram de cenários naturais, o gabinete do advogado de defesa tinha sido o do próprio Voelker e muitos dos jurados do filme tinham ocupado as mesmas cadeiras no tribunal no desenrolar do julgamento verídico (excepto os que já tinham falecido). Preminger pretendia o máximo de autenticidade e conseguia-o. Tudo isto aparece descrito na obra de Richard Griffith, director do New York Museum of Modern Art Film Library, que escreveu um ensaio chamado precisamente “Anatomy of a Motion Picture”, onde estuda todos estes aspectos da rodagem desta obra no Michigan.
Mas os direitos de adaptação da obra vieram parar às mãos de Otto Preminger somente depois de um complexo processo. Em Outubro de 1957, Voelker estabeleceu um acordo com o dramaturgo John Van Druten, pelo qual este último se encarregaria de escrever uma versão teatral para ser levada à cena na Broadway. Van Druten embolsaria 60% dos lucros e Voelker 40%, e ambos poderiam vender os direitos para uma versão cinematográfica. O que fizeram, a Ray Stark da Seven Arts Productions, acordando numa verba de 100,000 dólares, mais percentagem nos lucros. Van Druten morre em Dezembro desse ano, a peça nunca chega a subir a cena e os direitos de cinema, depois de muitas peripécias, acabam nas mãos de Otto Preminger, em Maio de 1958, um pouco inflacionados, 150,000 dólares. A transacção meteu tribunal e uma sentença favorável a Preminger, que se empenhara totalmente na realização desta obra que se transformaria rapidamente num dos mais invulgares êxitos dos chamados “filmes de tribunal”
Muitos foram os prémios que o filme alcançou (entre eles oito nomeações para os Oscars), mas basta referir uma lista, organizada pelo American Film Institute (AFI), em 2008, depois de consultados 1.500 depoentes da área do cinema, sobre os 10 melhores filmes de todos os tempos, na categoria de “Courtroom Drama” (dramas de tribunal) para se perceber a importância histórica desta obra. A lista é a seguinte: 1. “To Kill a Mockingbird”; 2. “12 Angry Men”, 3. “Kramer vs. Kramer”; 4. “The Verdict”; 5. “A Few Good Men”; 6. “Witness for the Prosecution”; 7. “Anatomy of a Murder”; 8. “In Cold Blood”; 9. “A Cry in the Dark” e 10. “Judgment at Nuremberg”. Pessoalmente, colocá-lo-ia nos três primeiros lugares, e Michael Asimow, professor de Direito da UCLA, afirma mesmo que este é “provavelmente o melhor filme de sempre realizado sobre tribunais” ("probably the finest pure trial movie ever made"). Na classificação da “Internet Movie Database” figura em 19º lugar, entre 807 filmes passados em tribunais.
Contam as crónicas da época que Otto Preminger pensou em vários actores antes de acertar o elenco definitivo. Lana Turner seria inicialmente “Laura Manion”, Richard Widmark esteve previsto para a figura do tenente, mas o mais surpreendente terá sido a escolha do juiz. Inicialmente, fora previsto Spencer Tracy, e depois Burl Ives, para o papel de “Juiz Weaver.” Por impossibilidade de ambos, Preminger virou-se para Joseph N. Welch, um advogado de Boston que tinha representado o governo dos EUA no Exército, no quente período da caça às bruxas levado a cabo pelo senador McCarthy. Joseph N. Welch enfrentou-o destemidamente, chegando a acusá-lo de “não ter um mínimo de decência”, marcando assim o início da queda do temível senador e do macarthismo. A escolha terá sido igualmente uma homenagem a um homem impoluto, que, aliás, conduz de forma magnífica todas as sessões do julgamento. Outra figura carismática que surge no filme, não só como autor de uma envolvente partitura musical, onde o jazz é uma constante, é Duke Ellington, que aparece na qualidade de Pie-Eye, um pianista de bar, tocando lado a lado com James Stewart. 
O filme aborda um caso de violação, onde, apesar de toda a discrição com que o tema é sugerido, acabou por criar alguns engulhos junto do “Production Code Administration”, o tão conhecido Código Hays. Depois de várias negociações, durante as quais algumas palavras foram banidas dos diálogos (esperma, penetração, clímax sexual, por exemplo), o filme foi rodado, mas não viu a sua aprovação final facilitada. Coisa que era comum nas obras de Otto Preminger, que foi um dos maiores sabotadores do Código (juntamente com Billy Wilder). A “The National Catholic Legion of Decency” levantou problemas e houve mesmo um estado, Chicago, onde o filme foi inicialmente proibido de exibir pelo “Police Film Censor”, e mais tarde autorizado depois de uma querela jurídica, com o juiz federal Julius Miner a aprová-lo, depois de não o ter considerado “obsceno.” Mas todos perceberam que “Anatomia de um Crime” continha linguagem “nunca ouvida num filme americano”.
A intriga resume-se no essencial ao seguinte: numa pequena cidade da chamada “Upper Peninsula”, de Michigan, o modesto advogado Paul Biegler (James Stewart), parece quase retirado de julgamentos, entretendo-se com a pesca, o piano e a companhia de um velho colega, Parnell McCarthy (Arthur O'Connell), que gosta imoderadamente de whisky. A secretária de Paul Biegler, Maida Rutledge (Eve Arden), vai tomando conta dos recados, sobretudo divórcios e outras irrelevâncias, quando recebe um telefonema inesperado. Laura Manion (Lee Remick), casada com o tenente Frederick "Manny" Manion (Ben Gazzara), recentemente regressado da Coreia, quer ser recebida. Laura é notícia nacional, todos sabem do caso que protagonizou: ao regressar à roulotte onde vive com Frederick, depois de uma noite passada num bar, é agredida e violada por Barney Quill. O marido, sabedor do ocorrido, agarra numa arma dirige-se ao bar e desfere alguns tiros certeiros em Barney, matando-o. Preso, não nega o assassinato, apenas pretende atenuantes para o acto. Laura quer que Paul Biegler o defenda em tribunal. Com um caso mediático entre mãos, este procura a colaboração de Parnell McCarthy, que tenta libertar-se da bebida para recompor as capacidades, e ambos partem para o processo, reunindo elementos.
A única forma de tentar atenuar a sentença, ou mesmo libertar o réu, é invocar insanidade temporária. Um psiquiatra militar está disposto a testemunhar. Mas pela frente vão ter o promotor de justiça local, D.A. (Brooks West), assistido por uma sumidade vinda da grande cidade, Claude Dancer (George C. Scott). Este é um daqueles chamados “dramas de tribunal”, como já foi referido e, portanto, tudo será dirimido com argumentos de ambas as partes, perante um júri de pessoas locais, escolhidas aleatoriamente, e um juiz particularmente cordato, Weaver (Joseph N. Welch), que procura sobretudo fazer ressaltar a verdade. 
 Acontece que Laura Manion não é santa de colocar no altar, tudo nela faz ressaltar a sensualidade e mesmo a provocação. E os jogos de bastidores intensificam-se. A defesa tenta tornar Laura uma dona de casa que procura divertir-se sem maldade com a pin box do bar, a acusação ataca-a pelo seu lado leviano. Esgrimem-se testemunhos contraditórios e todo o filme prende o espectador com o suspense desta troca de acusações, de inquirições de testemunhas, de revelações surpresa, de testemunhos inesperados. A estrutura do argumento é sólida e magnificamente conduzida, jogando com a investigação da defesa, esclarecendo factos ou obscurecendo outros, em proveito próprio.
Uma realização clássica, superiormente dirigida pelo austríaco Otto Perminger, faz de “Anatomia de um Crime” uma obra impar dentro do género, sendo que a fotografia de Sam Leavitt, num fulgurante preto e branco, é magnifica, bem como a banda sonora, onde sobressai a música de jazz de Duke Ellington. A descrição da pequena cidade é primorosa de rigor e autenticidade. Mas, num filme de tribunal, é perfeitamente compreensível que o elenco tenha de ser de altíssima qualidade para impor personagens e prender os espectadores. James Stewart é admirável na composição do discreto mas eficiente Paul Biegler, Lee Remick consegue inebriar na figura da provocadora Laura Manion, Ben Gazzara é secreto e misterioso como convém, Arthur O'Connell dá uma lição de bonomia e controlada truculência, George C. Scott é o impassível e incisivo promotor de justiça sem piedade nos interrogatórios e nas armas que utiliza. Os restantes mantêm o nível, o resultado é brilhante.
Como se sabe, os mecanismos da justiça norte-americana são muito diferentes dos da Europa ocidental. Nesse aspecto, o filme é a lição para quem quiser perceber essas nuances e descobrir igualmente algumas das regras de ouro por que se rege uma democracia que acredita que pode abeirar-se o mais possível da verdade. É obvio que a realidade nem sempre é como nos é narrada nos romances e nos filmes, mas é sempre bom ver defender as liberdades e os direitos dos cidadãos, mesmo num caso tão tortuoso como este que nos é apresentado, onde um estado de espírito alterado pela cólera e a sede de vingança pode ser considerado uma atenuante para um crime. Será lícito moral e juridicamente? Também nesse aspecto, “Anatomia de um Crime” continua muito actual, ainda que, 50 anos depois, dificilmente o resultado fosse o mesmo.

ANATOMIA DE UM CRIME
Título original: Anatomy of a Murder
Realização: Otto Preminger (EUA, 1959); Argumento: Wendell Mayes, segundo romance de John D. Voelker; Produção: Otto Preminger; Música: Duke Ellington; Fotografia (p/b): Sam Leavitt; Montagem: Louis R. Loeffler; Design de produção: Boris Leven; Maquilhagem: Del Armstrong, Harry Ray, Myrl Stoltz; Direcção de produção: Henry Weinberger; Assistentes de realização: David Silver, Hal W. Polaire, Ray Taylor Jr.; Departamento de arte: Howard Bristol; Genérico: Saul Bass; Som: Jack Solomon; Efeitos especiais: George Harris; Companhias de produção: Carlyle Productions; Intérpretes: James Stewart (Paul Biegler), Lee Remick (Laura Manion), Ben Gazzara (Lt. Frederick Manion), Arthur O'Connell (Parnell Emmett McCarthy), Eve Arden (Maida Rutledge), Kathryn Grant (Mary Pilant), George C. Scott (Claude Dancer), Duke Ellington, Orson Bean, Russ Brown, Murray Hamilton, Brooks West, Ken Lynch, Howard McNear, Alexander Campbell, Ned Wever, Jimmy Conlin, Lloyd Le Vasseur, James Waters, Joseph N. Welch, etc. Duração: 160 minutos; Distribuição em Portugal: Columbia /Tristar (DVD); Classificação etária: M/12 anos; 



A nota sobre Otto Preminger apareceu na folha referente a "Laura" 

BEN GAZZARA (1930-2012)
Ben Gazzara, com o nome de baptismo de Biagio Anthony Gazzara, nasceu em Nova Iorque, a 28 de Agosto de 1930, e viria a falecer em Nova Iorque, a 3 de Fevereiro de 2012, com 81 anos. Filho de imigrantes italianos, Ben nasceu e cresceu em Nova Iorque, tendo frequentado a conhecida Stuyvesant High School, enveredando decididamente pela carreira de actor. Chegou a estudar engenharia eléctrica na City College of New York, mas desistiu, para se matricular no Actor's Studio. Na década de 50, apareceu em vários espectáculos na Broadway, entre os quais “Gata em Telhado de Zinco Quente”, de Tennessee Williams, com encenação de Elia Kazan. Em 1957, estreia-se no cinema, em “The Strange One”.
Com uma carreira intensa, no cinema, na televisão e no teatro, Ben Gazzara também dirigiu alguns episódios de séries de TV e um filme de cinema. Muitos foram os seus papéis memoráveis, como “Anatomy of a Murder” (1959), “A Rage to Live” (1965), “Capone” (1975), “Voyage of the Damned” (1976), mas sobretudo os que interpretou sob as ordens do seu amigo John Cassavetes nos anos 70, “Husbands” (1970), “The Killing of a Chinese Bookie” (1976) ou “Opening Night” (1977). Nos anos 80, refiram-se “Saint Jack” e “They All Laughed”, ambos de Peter Bogdanovich.
Trabalhou imenso na televisão, começando por “Arrest and Trial” (1963—1964), na rede ABC e culminando em “Run for Your Life” (1965—1968), na NBC. Foi nomeado por três vezes para o Tony de melhor actor de teatro “A Hatful of Rain” (1956), “Hughie & Duet” (1975) e “Quem Tem Medo de Virginia Woolf?” (1977). Em 2003, ganhou o Emmy de Melhor Actor Secundário, no telefilme “Hysterical Blindness”. Três vezes nomeado para o Globo de Ouro de Melhor Actor de televisão, na série “Run for Your Life”.
Durante alguns anos viveu em Itália, tendo uma casa na Umbria. Casado com Louise Erickson (1951 – 1957), Janice Rule (1961 - 1982) e Elke Stuckmann (1982 - 2012). Faleceu em consequência de um cancro no pâncreas, em Fevereiro de 2012.

Filmografia
Cinéma
1957: The Strange One (Joko de Paris), de Jack Garfein
1959: Anatomy of a Murder (Anatomia de um Crime), de Otto Preminger
1960: Risate di gioia (O Ladrão Apaixonado), de Mario Monicelli
1961: The Young Doctors (Jovens Médicos), de Phil Karlson
1962: La Città Prigioniera (A Cidade Prisioneira), de Joseph Anthony
1962: Convicts 4 (Inferno Na Terra), de Millard Kaufman
1965: A Rage to Live, de Walter Grauman
1969: If It's Tuesday, This Must Be Belgium (Estes Turistas Americanos), de Mel Stuart
1969: The Bridge at Remagen (A Ponte de Remagem), de John Guillermin
1970: King: A filmed record... Montgomery to Memphis, de Joseph L. Mankiewicz e Sidney Lumet (documentário)
1970: Husbands (Maridos), de John Cassavetes
1972: Afyon Oppio, de Ferdinando Baldi
1973: The Neptune Factor (Uma Odisseia Submarina), de Donald Petrie
1975: Capone (Al Capone), de Steve Carver
1976: The Killing of a Chinese Bookie (A Morte de Um Apostador Chinês), de John Cassavetes
1976: High Velocity, de Remi Kramer
1976: Voyage of the Damned (A Viagem dos Malditos), de Stuart Rosenberg
1978: Opening Night (Noite de Estreia), de John Cassavetes
1979: Bloodline (Laços de Sangue), de Terence Young
1979: Saint Jack (Noites de Singapura), de Peter Bogdanovich
1981: Inchon, de Terence Young
1981: They All Laughed (Romance em Nova Iorque), de Peter Bogdanovich
1981: Storie di ordinaria follia (Contos da Loucura Normal), de Marco Ferreri
1983: La Ragazza di Trieste (A Rapariga de Trieste), de Pasquale Festa Campanile
1984: Uno Scandalo perbene, de Pasquale Festa Campanile
1985: La Donna delle meraviglie, de Alberto Bevilacqua
1985: Il Camorrista (O Professor), de Giuseppe Tornatore
1986: La Mémoire tatouée, de Ridha Behi et Henri Vart
1987: Figlio mio infinitamente caro, de Valentino Orsini
1987: Il Giorno prima, de Giuliano Montaldo
1988: Don Bosco, de Leandro Castellani
1989: Quicker Than the Eye, de Nicolas Gessner
1989: Road House (Profissão: Duro) de Rowdy Herrington
1990: Beyond the Ocean, de Ben Gazzara
1991: Per Sempre, de Walter Hugo Khouri
1992: Los de Enfrente, de Jesús Garay
1993: Anything for John, de Dominique Cazenave e Doug Headline (documentário)
1994: Sherwood's Travels, de Ron Coswell e Steve Miner
1994: Nefertiti, figlia del sole, de Guy Gilles
1994: Les hirondelles ne meurent pas à Jérusalem, de Ridha Behi
1995: Banditi, de Stefano Mignucci
1996: Ladykiller (Na Cena do Crime), de Terence H. Winkless
1996: Una Donna in fuga, de Roberto Rocco
1996: The Zone, de Barry Zetlin
1996: John Cassavetes: To risk everything to express it all, de Rudolf Mestdagh (documentário)
1997: Vicious Circles, de Sandy Whitelaw
1997: Farmer & Chase, de Michael Seitzman
1997: Shadow Conspiracy, de George Pan Cosmatos
1997: Stag, de Gavin Widling
1997: The Spanish Prisoner (O Prisioneiro Espanhol), de David Mamet
1998: Shark in a Bottle, de Mark Anthony Little
1998: Poor Liza, de Slava Tsukerman
1998: Too Tired to Die, de Wonsuk Chin
1998: Buffalo '66 (Buffalo '66), de Vincent Gallo
1998: The Big Lebowski (O Grande Lebowski), de Joel Coen
1998: Happiness (Felicidade),  de Todd Solondz
1998: Illuminata, de John Turturro
1999: Paradise Cove, de Robert Clapsadle
1999: Summer of Sam (Verão Escaldante), de Spike Lee
1999: The Thomas Crown Affair (O Caso Thomas Crown), de John McTiernan
2000: Home Sweet Hobokenk de Yoshifumi Hosoya
2000: Blue Moonk de John A. Gallagher
2000: Believe, de Robert Tinnell
2000: Very Mean Men, de Tony Vitale
2000: Undertaker's Paradise, de Matthias X. Oberg
2000: Jack of Hearts, de Serge Rodnunsky
2000: The List, de Sylvain Guy
2000: A constant forge, de Charles Kiselyak (documentário)
2001: Nella terra di nessuno, de Gianfranco Giagni
2001: Broadway: The golden age, by the legends who were there, de Rick McKay (documentário)
2002: Schubert, de Jorge Castillo
2003: L'Ospite segreto, de Paolo Modugno
2003: Dogville (Dogville), de Lars von Trier
2003: Dogville confessions, de Sami Saif (documentário)
2004: Quiet Flows the Don, de Serge Bondartchouk
2005: The shore, de Dionysius Zervos
2005: Bonjour Michel, de Arcangelo Bonaccorso
2005: Paris je t'aime - episódio "Quartier latin", de Gérard Depardieu e Frédéric Auburtin
2008: Looking for Palladin, de Andrzej Krakowski
2008: Eve, de Natalie Portman (curta-metragem)
2008: Beyond wiseguys: Italian americans & the movies, de Steven Fischler (documentário)
2009: Holy Money, de Maxime Alexandre
2010: 13, de Gela Babluani
2010: Christopher Roth, de Maxime Alexandre
2011: Chez Gino, de Samuel Benchetrit
2011: Ristabbanna, de
2012: Max Rose, de

Televisão
1961: Cry Vengeance!
1963: Arrest and Trial (série de TV) (1963-1964)
1964: Carol for Another Christmas
1965: Run for Your Life (série de TV)
1972: When Michael Calls
1972: Fireball Forward
1972: The Family Rico
1972: Pursuit
1973: You'll Never See Me Again
1973: Maneater
1974: QB VII (série de TV)
1977: The Death of Richie
1977: The Trial of Lee Harvey Oswald
1982: A Question of Honor
1985: An Early Frost)
1985: A Letter to Three Wives
1987: Police Story: The Freeway Killings
1987: Downpayment on Murder
1990: People Like Us
1991: Lies Before Kisses
1993: Blindsided
1993: Love, Honor & Obey: The Last Mafia Marriage
1994: Les Gens d'en face
1994: Parallel Lives
1994: Fatal Vows: The Alexandra O'Hara Story
1995: Convict Cowboy
1997: The Notorious 7
1998: Valentine's Day
1998: Angelo nero
1998: Il Tesoro di Damasco (série de TV)
1999: Un Bacio nel
1999: Tre stelle (série de TV)
2000: Piovuto dal cielo
2001: Brian's Song
2002: Hysterical Blindness
2008: Meurtres à l'Empire State Building

Como realizador
1968: The Name of the Game" - (série de TV)
1974: Columbo – episódio “A Friend in Deed” (série de TV)
1975: Columbo – “Troubled Waters” (série de TV)
1990: Beyond the Ocean

LEE REMICK (1935–1991)
Lee Ann Remick nasceu a 14 de Dezembro de 1935, em Quincy, Massachusetts, EUA, e viria a falecer, de cancro, com 55 anos, a 2 de Julho de 1991, em Los Angeles, Califórnia, EUA. Filha de um comerciante e da actriz Patricia Remick, estuda dança com Ruth Swoboda e bailado moderno com Charles Weidman. Em 1952, estreia-se como bailarina, e no ano seguinte surge na Broadway e na televisão. Elia Kazan descobre-a e lança-a no cinema em “Um Rosto na Multidão” (1957). Um dos seus grandes papéis é em “Anatomia de Um Crime” (1959), a que se segue “Escravos do Vício” (1962), ao lado de Jack Lemmon, que lhe oferece uma nomeação para Oscar de Melhor Actriz. Foi nomeada igualmente para o Tony de Melhor Actriz Dramática de teatro, da Broadway, em "Wait Until Dark”. Em 1962, Lee Remick tinha sido indicada para substituir Marilyn Monroe no seu filme “Something's Got to Give”, da 20th Century Fox. Dean Martin, parceiro de Marilyn, recusou-se a trabalhar com mais alguém a não ser Marilyn. O filme nunca se terminou. Em 1970, deixa os EUA e passa a viver em Inglaterra, com o seu segundo marido, Kip Gowans (1970 - 1991). Casada anteriormente com Bill Colleran (1957 - 1968). A 29 de Abril de 1991, fez a sua última aparição pública, já muito debilitada, para receber a sua estrela, no Passeio da Fama em Hollywood. Morreria dois meses depois. Foi cremada no Westwood Memorial Park.

Filmografia:
No cinema
1957: A Face in the Crowd (Um Rosto na Multidão), de Elia Kazan
1958: The Long, Hot Summer (Paixões Que Escaldam), de Martin Ritt
1959: These Thousand Hills (Duelo na Lama), de Richard Fleischer
1959: Anatomy of a Murder (Anatomia de Um Crime), de Otto Preminger
1960: Wild River (Quando o Rio Se Enfurece), de Elia Kazan
1961: Sanctuary (Requiem para uma Freira), de Tony Richardson
1962: Experiment in Terror (Uma Voz na Escuridão), de Blake Edwards
1962: Days of Wine and Roses (Escravos do Vício), de Blake Edwards
1963: The Running Man (Um Homem em Fuga), de Carol Reed
1963: The Wheeler Dealers, de Arthur Hiller
1965: Baby the Rain Must Fall (Errando pelo Caminho), de Robert Mulligan
1965: The Hallelujah Trail (A Batalha da Colina de Whisky), de John Sturges
1968: No Way to Treat a Lady (Não Se Trata Assim uma Senhora), de Jack Smight
1968: The Detective (O Detective), de Gordon Douglas
1969: Hard Contract (Estranho Contacto), de S. L. Pogostin
1970: Loot, de Silvio Narizzano
1970: Sometimes a Great Notion (Os Indomáveis), de Paul Newman
1970: A Severed Head (Ligações Cruzadas), de Dick Clement
1973: A Delicate Balance (Equilíbrio Instável), de Tony Richardson
1974: Touch Me Not, de Douglas Fithian
1975: Hennessy (Hennessy), de  Don Sharp
1976: The Omen (O Génio do Mal), de Richard Donner
1977: Telefon (Telefone), de Don Siegel
1978: The Medusa Touch (O Toque da Medusa), de Jack Gold
1979: The Europeans (Os Europeus), de James Ivory
1980: The Competition (Um Amor em Competição), de Joel Oliansky
1980: Tribute (A Homenagem), de Bob Clark
1986: Emma's War, de Clytie Jessop

Na televisão:
Tudo teledramáticos, com as excepções assinaladas
1953: Judy and the Brain
1953: Double in Ivory
1953: The Picket Fence
1954: The Death and Life of Larry Benson
1955: One Hill, One River
1955: The Diamond as Big as the Ritz
1955: It Depends on You
1955: Man Lost
1956: The Landlady's Daughter
1956: Three Men from Tomorrow
1956: All Expenses Paid
1956: The Young and the Beautiful
1957: Circle of Fear
1957: The Last Tycoon
1958: The Last Clear Chance
1960: The Tempest
1962: The Farmer's Daughter
1967: Damn Yankees!
1972: The Man Who Came to Dinner
1972: Summer and Smoke
1973: And No One Could Save Her
1973: The Blue Knight
1974: QB VII (série de TV)
1975: Hustling
1975: A Girl Named Sooner
1977: The Ambassadors
1978: Breaking Up
1978: Wheels (série de TV)
1979: Torn Between Two Lovers
1980: Ike
1980: Haywire
1980: The Women's Room  
1982: I Do! I Do!
1982: The Letter
1983: The Gift of Love: A Christmas Story
1984: A Good Sport
1984: Mistral's Daughter (série de TV)
1984: Rearview Mirror
1984: American Pioneers
1985: The Snow Queen
1985: Toughlove
1986: Eleanor: In Her Own Words
1986: Of Pure Blood
1987: The Vision
1987: Nutcracker: Money, Madness & Murder (série de TV)
1988: Jesse
1989: Bridge to Silence
1989: Around the World in 80 Days (mini-série)
1989: Dark Holiday

No teatro, interpretou “Be Your Age” (1953), “Anyone Can Whistle” (1964), “Wait Until Dark” (1966), “A Little Night Music”, “Annie Get Your Gun”, “Brigadoon” ou “The Seven Year Itch”.

SESSÃO 47: 6 DE OUTUBRO DE 2014

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 PSICO (1960)


“Psico” não será seguramente o melhor Alfred Hitchcock de sempre, mas é um dos mais míticos, senão mesmo “o” Hitchcok por excelência, aquele em que todos os espectadores o revêem como o mestre do “suspense”. Seguramente das suas obras mais referida, citada, parodiada, imitada, e nunca igualada. Teve três sequelas, uma delas realizada pelo próprio Anthony Perkins, mas nenhuma delas merecia continuar sequer o original. Um cineasta de prestígio, Gus Van Sant, realizou uma remake, em 1989, com Vince Vaughn, Anne Heche e Julianne Moore, que, sendo interessante, fica a léguas da versão de 1960.
O próprio realizador contou que “Psico não custou mais de 800 mil dólares e rendeu (até essa altura em que ele falava, há cerca de 50 anos), mais de 13 milhões de dólares”. Terá sido o maior sucesso da carreira do mestre do “suspense”. O argumento, que conta com algumas incoerências (Hitch não gostava especialmente do romance), aguenta-se sobretudo pela fabulosa realização de Hitch. Baseado numa obra de Robert Bloch, e adaptada por Joseph Stefano, “Psyco” dir-se-ia à partida mal construído. Puro engano. Aliás, um dos muitos “enganos” em que esta obra é fértil. O engano está talvez na base do seu sucesso. Na verdade, o argumento é farto em aparentes falsas pistas. Uma das especialidades de Hitch era o chamado efeito "MacGuffin", que consiste em introduzir algo que parece ser profundamente importante para a história que estamos a ver, mas que daí a pouco se revela irrelevante. Talvez valha a pena explicar o que ficou conhecido por "MacGuffin". Segundo o “Oxford English Dictionary”, Hitchcock definiu "MacGuffin", em 1939, numa conferência dada na Universidade de Columbia: “No estúdio chamava-se "MacGuffin" ao “elemento motor que aparecia em qualquer argumento. Numa história de ladrões era o colar, numa história de espionagem era fatalmente um documento…” Normalmente, este elemento que desvia as atenções num determinado sentido, acaba por ter apenas esse efeito: desviar as atenções. Hitchcock utilizou este processo muitas vezes e uma das mais célebre obras onde ele aparece, e por mais de uma vez, é precisamente "Psico". 

Hitchcock conta mesmo uma história a François Truffaut: "Dois viajantes encontram-se num comboio que vai de Londres para Edimburgo. Um pergunta ao outro: - O que é esse embrulho que leva aí em cima? - Ah isto?, é um MacGuffin. – E o que um MacGuffin? – Um aparelho para capturar leões nas montanhas da Escócia. – Mas não há leões na Escócia! – Bom, nesse caso, isto não é um MacGuffin”. Nem tudo o que surge num filme, numa história, tem de ter uma explicação plausível e uma importância decisiva no seu desenrolar. Vejamos então a intriga de “Psico”:
Marion Crane (Janet Leigh) e Sam Loomis (John Gavin) são surpreendidos num quarto de hotel. Últimas carícias antes de iniciarem a reposição da normalidade. Trata-se de um casal de amantes clandestinos que terminam mais um fugaz encontro. A cidade é Pheonix, no Arizona, o dia 11 de Dezembro, uma sexta-feira. Passam poucos minutos das 14,30 horas. Todos estes elementos são reveladores, a seu tempo. Marion é secretária numa agência imobiliária de Pheonix, Sam vive numa cidade distante e vai apanhar o avião. As relações entre os amantes estão tensas. Ela quer viver em comum, ele tem uma família e um divórcio a tratar, a seu tempo. A separação, depois de uma tarde de amor e sexo, não é idílica. Marion regressa ao emprego a tempo de ver voltar o patrão de um almoço de negócios onde vendeu uma casa por 40.000 dólares a um milionário gabarolas que paga em notas. É Marion que fica encarregue de guardar o dinheiro durante o fim-de-semana e de o depositar na segunda-feira. De posse da avultada quantia, Marion argumenta que está com dores de cabeça e que vai sair mais cedo. Guarda o dinheiro num envelope e este dentro da sua mala de mão. 

No automóvel, a caminho de casa, percebe-se que os seus planos podem ser outros. Em casa, arranja à pressa uma mala e parte em viagem. Vemo-la a conduzir o seu carro pelas ruas da cidade, cruza-se com o patrão que atravessa uma avenida e olha surpreendido para ela. Um primeiro filme começou: Marion acaba de roubar 40.000 dólares e vai ter com o amante, calcula-se. Conseguirá ela os seus intentos? Vemo-la de frente, a conduzir o carro, em plano aproximado. Travelling recuando, acompanhando o percurso do carro. Por detrás do rosto de Marion, a vida habitual da cidade que agora surge estranha, ameaçadora. Tudo parece perseguir Marion e, todavia, ela não é uma ladra antipática. Pelo contrário, conquista a empatia do espectador. Queremos talvez que ela consiga atingir os seus fins. Mas, cansada, adormece na berma da estrada e um polícia acorda-a ao romper do dia. O “suspense” cresce. Será descoberta? O agente da autoridade suspeita de algo? Depois de verificar os documentos, deixa-a seguir caminho, mas persegue-a. Quando Marion julga tê-lo despistado, vai trocar de carro. Mas levanta mais suspeitas ainda e o polícia reaparece. Marion continua viagem e resolve hospedar-se num pequeno motel à beira de uma estrada quase desactivada. Vai passar aí a noite. O motel é dirigido por Norman Bates (Anthony Perkins), que a regista no seu livro de entradas e lhe dá a chave do apartamento nº 1, o único que passará a estar ocupado. Marion desfaz a mala e esconde as notas nas páginas de um jornal que coloca sobre a mesinha de cabeceira. O mais à vista possível para assim estar o mais resguardado possível de interesses suspeitos. Curiosamente, o “filme” sobre o roubo de 40.000 dólares acaba aqui. Outro começa.

Norman Bates convida a hóspede para comer umas sanduíches que vai preparar no casarão do lado, onde diz viver com mãe. Mas antes espreita, através de um buraco disfarçado na parede, o interior do apartamento nº 1, onde Marion se despe. Norman não tem uma aparência muito normal. Será um tarado sexual que apanha as vítimas naquele quarto especial, as viola e sabe-se lá que mais? O “suspense” volta a adensar-se, agora noutra direcção. O escritório de Bates e a casa ostentam cadáveres embalsamados de aves. Aves em poses agressivas, prenunciando “Os Pássaros”. Ouve-se Norman e a mãe a discutirem e esta a proibi-lo de trazer para casa “aquelas mulheres oferecidas”. O espectador pode pensar que Norman é um jovem reprimido por uma mãe puritana e castradora, que, pela calada da noite, se vinga sexualmente nas mulheres que caem na teia do seu velho motel. Anda-se perto da verdade, mas este é ainda um outro filme. A protagonista do primeiro está prestes a sair de cena, na sequência mais célebre de todos os filmes de “suspense” e terror. Quando toma um duche na casa de banho do apartamento, Marion é barbaramente assassinada. O filme foi muito célere a ser rodado, Hitchcock ganhara experiência na televisão, o preto e branco ajudava. Mas, para rodar esta sequência gastou uma semana e filmou 70 planos que surgem numa montagem impressionante, que define bem o seu génio cinematográfico. E que vai contra todas as regras do código de ética ainda em vigor nos EUA. Mais uma pedra a justificar a sua anulação. 


Com Marion morta e enterrada, juntamente com o jornal e as notas, num perdido pântano, “Psico” muda de via. Agora o protagonista deixou de ser a mulher que roubou, para passar a ser o jovem assassino que se esconde no estranho Bates Motel. Desaparecida e perseguida pelo roubo, Marion é procurada pelo amante e pela sua irmã Lila (Vera Miles), mas também pelo detective privado Milton Arbogast (Martin Balsam). Acabam todos por ir parar ao Bates Motel e o “suspense” parece residir agora em saber quando e como Norman será descoberto. Já agora poderá interessar saber qual a relação que este mantém com a mãe na velha mansão que domina a paisagem. Mas quando procuram o xerife Al Chambers (John McIntire), este informa-os que a mãe de Norman Bates está morta e enterrada há muito. “Se está viva, quem terá sido enterrado no lugar dela?”, pergunta, numa guinada no entrecho e mais um "MacGuffin" a acrescentar à lista. “Psico” é exemplar nesta construção de teias emaranhadas que indiciam aparentes falsas pistas que, todavia, não o chegam igualmente a ser na totalidade. Pois cada uma delas acabará por desempenhar um papel importante. Digamos que são etapas sucessivas, camadas sobrepostas, tendentes a criar um clima inquietante cada vez mais intrigante e asfixiante. Hitchcock é mestre indiscutível na arte de manipular o espectador, levando-o a sofrer. Como bom inglês, puritano no aspecto mais evidente, bem perverso na essência, fruto de uma rígida educação paternal que o levou a descobrir o medo bem novo, Hitch encarrega-se de explorar estes terrenos, da mesma forma que percorre os caminhos do Mal e os procura aprofundar de título em título. Norman Bates é outro exemplo claro da transfiguração do Mal, a reencarnação de uma mãe possessiva e castradora, que lhe inculca o ódio às mulheres que o podem seduzir e dela afastar, e que o leva a transformar-se definitivamente nessa imagem, que é encenada na derradeira cena, quando o rosto de Bates é literalmente possuído pela caveira inspiradora, numa montagem quase subliminar, mas de efeito seguro junto do público.

Admiravelmente narrado, com uma interpretação magnífica, uma fotografia a condizer e uma partitura musical de mestre Bernard Hermann, que ficou para sempre na História, “Psico” pode não ser o melhor Hitch de sempre, mas é decididamente uma obra-prima de cinema.



PSICO
Título original: Psycho
Realização: Alfred Hitchcock (EUA, 1960); Argumento: Joseph Stefano, segundo romance de Robert Bloch; Produção: Alfred Hitchcock; Música: Bernard Herrmann; Fotografia (p/b): John L. Russell; Montagem: George Tomasini; Casting: Jere Henshaw; Direcção artística: Robert Clatworthy, Joseph Hurley; Decoração: George Milo; Guarda-roupa: Rita Riggs; Maquilhagem: Jack Barron, Florence Bush, Robert Dawn; Direcção de produção: Lew Leary; Assistentes de realização: Hilton A. Green, Lester Wm. Berke; Departamento de arte: Saul Bass, Bob Bone, Dave Lee, Harold Wolf; Som: William Russell, Waldon O. Watson; Efeitos especiais: Clarence Champagne, Walter Hammond; Intérpretes: Anthony Perkins (Norman Bates), Vera Miles (Lila Crane), John Gavin (Sam Loomis), Janet Leigh (Marion Crane), Martin Balsam (Det. Milton Arbogast), John McIntire (Al Chambers), Simon Oakland, Frank Albertson, Patricia Hitchcock, Vaughn Taylor, Lurene Tuttle, John Anderson, Mort Mills, Alfred Hitchcock (homem no exterior do escritório), etc. Duração: 109 minutos; Distribuição em Portugal: Universal (DVD); Classificação etária: M/12 anos; Estreia em Portugal: 22 de Novembro de 1960.



Sobre Alfred Hitchcock ver folha de “Janela Indiscreta”
Sobre Anthony Perkins ver folha de “Sangue no Deserto”

 
 
JANET LEIGH (1927 – 2004)
Jeanette Helen Morrison, mais conhecida por Janet Leigh, nasceu a 6 de Julho de 1927, em Merced, Califórnia, EUA, e faleceu a 3 de Outubro de 2004, em Beverly Hills, Los Angeles, Califórnia, EUA. Filha única de um casal de origem dinamarquesa, Helen Lita e Frederick Robert Morrison, que se deslocava de cidade em cidade, Jeanette teve uma infância solitária. Depois de acabar a escola aos 15 anos, frequentava habitualmente as salas de cinema, estudou música e psicologia, até ser descoberta pela actriz Norma Shearer, que a levou a um teste na MGM, sendo contratada para interpretar “The Romance of Rosy Ridge” (1947). Foi o início de uma carreira relevante, dispersa por muitos géneros, da comédia ao musical, do drama ao western, da aventura ao terror, tendo contracenado com grandes actores como Errol Flynn, Gary Cooper, James Stewart, Kirk Douglas, Paul Newman, Jerry Lewis, Jack Lemmon, Frank Sinatra e John Wayne, quase sempre em papéis de jovem ingénua e bem comportada. Participou em várias obras importantes, como “Acto de Violência” (1948), “Os Reis do Espectáculo” (1948), “Mulherzinhas” (1949), “Quando as Viúvas Querem Casar” (1949), “Angels in the Outfield” (1951), “Scaramouche” (1952), “Houdini, O Grande Mágico” (1953), “Esporas de Aço” (1953), “O Escudo Negro” (1954), “O Rapaz Atómico” (1954), “Há Falta de Homens” (1955), “Safari” (1956), “A Sede do Mal” (1958), “O Candidato da Manchúria” (1962), “Harper, Detective Privado” (1966), entre outras. Em 1980, aparece ao lado da sua filha Jamie Lee Curtis, em “O Nevoeiro” (1980), e depois em “Halloween H20: O Regresso” (1998). Com o então marido, Tony Curtis, interpretou cinco títulos: “Houdini, O Grande Mágico” (1953), “O Escudo Negro” (1954), “Os Vikings” (1958), “The Perfect Furlough” (1958) e “Who Was That Lady?” (1960). Mas o seu grande papel fica a dever-se a Alfred Hitchcock, que lhe assegura o triunfo em “Psico” (1960), onde ganha o Globo de Ouro para Melhor Actriz Secundária e é nomeada para o Oscar na mesma categoria. Janet Leigh é autora de diveros livros. “There Really Was a Hollywood”, foi um grande sucesso. “House of Destiny” e “The Dream Factory” são romances, a que se seguiu “Psycho: Behind the Scenes of the Classic Thriller”. Casada com John Carlisle (aos 14 anos, 1942 – 1942, casamento anulado), Stanley Reames (1945 – 1949), Tony Curtis (1951 – 1962) e Robert Brandt (1962 – 2004). Mãe de Kelly Curtis e Jamie Lee Curtis. Morreu de ataque de coração e as cinzas encontram-se no Westwood Village Memorial Park Cemetery. Tem uma Estrela no Hollywood Walk of Fame em 1777 Vine Street, Hollywood, Califórnia.

Filmografia:
cinema
1947: The Romance of Rosy Ridge, de Roy Rowland
1948: If Winter Comes (Intriga), de Victor Saville
1948: Hills of Home (O Dono de Lassie), de Fred M. Wilcox
1948: Words and Music (Os Reis do Espectáculo), de Norman Taurog
1948: Act of Violence (Acto de Violência), de Fred Zinnemann
1949: How to Smuggle a Hernia Across the Border, de Jerry Lewis (curta-metragem)
1949: Little Women (Mulherezinhas), de Mervyn LeRoy
1949: The Red Danube (O Danúbio Vermelho), de George Sidney
1949: The Doctor and the Girl (A Grande Profissão), de Curtis Bernhardt
1949: The Forsyte Woman (A Glória de Amar), de Compton Bennett
1949: Holiday Affair (Quando as Viúvas Querem Casar), de Don Hartman
1951: Strictly Dishonorable, de Melvin Frank e Norman Panama
1951: Angels in the Outfield, de Clarence Brown
1951: Two Tickets to Broadway (Dois Bilhetes Para a Glória), de James V. Kern
1951: It's a Big Country, de Charles Vidor,
1952: Just This Once (Milionário... Sem Dinheiro), de Don Weis
1952: Scaramouche (Scaramouche), de George Sidney
1952: Fearless Fagan (Fargan, o Destemido, na TV), de Stanley Donen
1953: The Naked Spur (Esporas de Aço), de Anthony Mann
1953: Confidentially Connie) de Edward Buzzell
1953: Houdini (1953 Houdini, O Grande Mágico), de George Marshall
1953: Walking My Baby Back Home (O Falso Caruso), de Lloyd Bacon
1954: Prince Valiant (Príncipe Valente), de Henry Hathaway
1954: Living It Up (O Rapaz Atómico), de Norman Taurog
1954: The Black Shield of Falworth (O Escudo Negro), de Rudolph Maté
1954: Rogue Cop (Pecado e Redenção), de Roy Rowland
1955: Pete Kelly's Blues (Melodia Negra), de Jack Webb
1955: My sister Eileen (Há Falta de Homens), de Richard Quine
1956: Safari (Safari), de Terence Young
1957: Jet Pilot (As Estradas do Inferno), de Josef von Sternberg
1958: Touch of Evil (A Sede do Mal), de Orson Welles
1958: The Vikings (Os Vikings), de Richard Fleischer
1958: The Perfect Furlough (Um Solteiro em Paris), de Blake Edwards
1960: Who Was That Lady ? (Quem era Aquela Garota?), de George Sidney
1960: Psycho (Psico), de Alfred Hitchcock
1960: Pepe (Pepe), de George Sidney (caméo)
1962: The Manchurian Candidate (O Candidato da Manchúria), de John Frankenheimer
1963: Bye Bye Birdie (Como é Bom Amar), de George Sidney
1963: Wives and Lovers (Entre Marido e Mulher, não Metas Outra Mulher), de John Rich
1966: Kid Rodelo (Kid Rodelo), de Richard Carlson
1966: Harper (Harper, Detective Privado), de Jack Smight
1966: Three on a Couch (Uma Poltrona para Três), de Jerry Lewis
1966: An American Dream (Espero-te no Inferno, Querida), de Robert Gist
1967: Ad ogni costo (O Último Trunfo), de Giuliano Montaldo
1969: Hello Down There (A Casa Foi ao Fundo), de Jack Arnold e Ricou Browning
1972: One Is a Lonely Number (Mulheres sem Marido), de Mel Stuart
1972: Night of the Lepus, de William F. Claxton
1979: Boardwalk, de Stephen Verona
1980: The Fog (O Nevoeiro), de John Carpenter
1983: Psycho II (Psico II)), de Richard Franklin (cameo)
1986: Psycho III (Psico III), de Anthony Perkins (cameo)
1990: Psycho IV (Psico IV), de Mick Garris (aprersentação do filme)
1998: Halloween H20: 20 Years Later (Halloween H20: O Regresso), de Steve Miner
2005: Bad Girls from Valley High), de John T. Kretchmer

Televisão
1957: Schlitz Playhouse of Stars (série de TV)
1964 - 1966: Bob Hope Presents the Chrysler Theatre (série de TV)
1966: The Man from U.N.C.L.E. (série de TV)
1966, 1969: The Red Skelton Show (série de TV)
1968: The Danny Thomas Hour (série de TV)
1968: The Bob Hope Show (série de TV)
1969: The Monk, de George McCowan (telefilme)
1969: Honeymoon with a Stranger, de John Peyser (telefilme)
1970: House on Greenapple Road, de Robert Day (telefilme)
1970: Le Virginien (série de TV)
1970: The Tim Conway Comedy Hour (série de TV)
1970: Bracken's World (série de TV)
1971: The Name of the Game (série de TV)
1971: My Wives Jane, de Edward H. Feldman (telefilme)
1971: Deadly Dream, de Alf Kjellin (telefilme)
1973: Ghost Story (série de TV)
1973: Murdock's Gang, de Charles S. Dubin (telefilme)
1973: Love Story (série de TV)
1975: Movin' On (série de TV)
1975: Columbo: Forgotten Lady (série de TV)
1977: Murder at the World Series, de Andrew V. McLaglen (telefilme)
1977: Telethon, de David Lowell Rich (telefilme)
1978, 1985: The Love Boat (série de TV)
1979: Mirror, Mirror, de Joanna Lee (telefilme)
1979, 1982: Fantasy Island (série de TV)
1982: Matt Houston (série de TV)
1982, 1984: Tales of the Unexpected (série de TV)
1998: On Our Way, de Michael Pressman (telefilme)
1986: Starman (série de TV)
1987: Arabesque (série de TV)
1997: The Twilight Zone ou The New Twilight Zone (série de TV)
1997: Touched by an Angel (série de TV)
1998: In My Sister's Shadow, de Sandor Stern (telefilme)
2001: Family Law (série de TV)

SESSÃO 48: 13 DE OUTUBRO DE 2014

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O APARTAMENTO (1960)
Claro que se poderá afirmar que este “The Apartment”, de Billy Wilder, é uma comédia. Mas de comédia amarga se trata, na verdade. Pode contar-se a sua intriga sob a forma de anedota ligeira e divertida: C. C. Baxter (Jack Lemmon) é um dos milhares de empregados de uma enorme companhia de seguros sediada Nova Iorque, correm os anos 50. Solteiro e algo desinspirado em matéria de vida para lá da secretária do seu escritório em “open space”, parece mais interessado nas suas máquinas de calcular que lhe prometem uma possível promoção e a respectiva subida de andares no majestoso arranha-céus de Manhattan, do que nas suas experiências amorosas. Para si, chegar a casa e aquecer uma refeição congelada, é o bastante para sobreviver. Por isso não se importa de ceder o seu apartamento para as libidinosas aventuras clandestinas dos seus colegas de trabalho. Muitas vezes tem de fazer horas no passeio em frente de casa, à espera que a luz do apartamento se apague e o já saciado casal que nele habitou por empréstimo durante duas horas desça as escadas, para enfim ele poder subir e passar pelas brasas até ao dia seguinte. Algumas vezes seca horas ao frio e à chuva, contraindo as consequentes gripes e constipações, na esperança de que os seus superiores hierárquicos dêem por terminada a sessão erótica e se lembrem da sua generosidade quando da futura promoção.

Ele habita o 19º andar, mas aspira chegar às chefias no 27º. Curiosamente, quem o faz subir literalmente de andar é a ascensorista Fran Kubelik (Shirley MacLaine), que se afigura uma discreta e respeitável jovem, de cabelo curto e olhar amplo, por quem Baxter sente um secreto fascínio. Até aqui a coisa parece prometer um final feliz, com o casal a aproximar-se, e o ganancioso e moderado arrivista Baxter a redimir-se pelo amor da jovem donzela. Isto era se não conhecêssemos a ironia crítica e uma certa dose de perversidade que Billy Wilder sempre empresta às suas obras. O golpe de teatro dá-se quando Baxter descobre que o seu chefe máximo (Fred MacMurray) afinal lhe pede a chave do apartamento para ali se encontrar com a sua predilecta Kubelik, que está perdidamente apaixonada pelo patrão, casado e pai de filhos, que encontra na bela ascensorista uma interessante maneira de passar uns momentos de relaxe. O filme, que já não era até esta altura uma comédia risonha, transforma-se progressivamente numa dilacerante comédia dramática de maus costumes, onde o poder dita leis e os mais fracos são triturados pelo despotismo de quem dispõe das melhores cartas para triunfar na vida.
Baxter nem é um mau carácter, é antes um pobre diabo solitário que tenta aproveitar-se das oportunidades que o seu apartamento lhe oferece. A simpática Kubelik está muito longe de ser a galdéria que manipula o patrão em seu proveito: ela ama-o verdadeiramente, e espera que o mesmo se divorcie da mulher, como ele próprio afiança, cantando a bela canção do cigano que todos conhecem. O argumento, da dupla Billy Wilder e I.A.L. Diamond, está escrito com uma inteligência e sensibilidade invulgares, mas igualmente com uma irónica amargura que faz deste cineasta de origem europeia (nasceu no antigo território austro-húngaro, que tantos talentos ofertou a Hollywood durante o grande êxodo provocado pelo nazismo) um modelo da perfeita combinação da cultura do velho continente com o sentido do espectáculo norte-americano. Os diálogos são, como sempre em Wilder, magníficos, ambíguos e sarcásticos, cheios de duplos sentidos, merecendo bem o argumento o Oscar que lhe foi atribuído. Wilder também foi considerado o realizador do ano, e o filme foi o melhor de 1960, na celebração da Academia de 1961. Houve ainda Oscars, todos justos, para a direcção artística (Alexandre Trauner e Edward G. Boyle) e a montagem (Daniel Mandell). Nomeações ainda para actores, que não as ganharam, o que parece hoje uma tremenda injustiça (Jack Lemmon, Shirley MacLaine e Jack Kruschen), para a fotografia a preto e branco (Joseph LaShelle), belíssima, no seu tom carregado de densas nuvens, ambientes saturados, avenidas batidas pelo vento e a chuva, e o som (Gordon Sawyer).
A construção do filme é modelar, na forma como apresenta inicialmente a estrutura, de um jeito de quase bonomia inconsequente, para progressivamente adensar o clima, criando um mal-estar moral que se instala. A configuração das personagens é toda ela brilhante, para o que muito contribuem o talento de Jack Lemmon e Shirley MacLaine, em portentosos trabalhos de grande complexidade psicológica. O jogo, não só de cartas, mas de sentimentos, de encontros e desencontros, que se estabelece entre ambos, ao longo de todo o filme, é um prodígio de rigor, de contenção emotiva e de disciplina técnica. Jack Kruschen, na figura do Dr. Dreyfuss, o médico vizinho de Baxter, que lhe pede que legue o esqueleto a uma instituição médica para ser estudado depois de morto, dado o superior desempenho sexual que ele julga infatigável, ao longo de tardes e noites de luta libidinosa paredes meias à sua casa, é outra personagem inesquecível. Aliás, “O Apartamento” é ainda notável por enfrentar com coragem as directrizes do código de censura do cinema americano, apresentando alguns temas tabus na época, como sexo pelo prazer, adultério, tentativas de suicídio, e algo mais. Tudo isto, tendo como pano de fundo um inverno cinzento que culminará num dramático Natal que será a mola decisiva que irá desencadear o final, onde, ao contrário do “happy end” tradicional, se reatará uma incompleta partida de cartas que talvez afiance que o amor é um jogo onde se pode perder e ganhar, mas que vale sempre a pena baralhar as cartas e dar de novo.   


O APARTAMENTO
Título original: The Apartment
Realização: Billy Wilder (EUA, 1960); Argumento: Billy Wilder, I.A.L. Diamond; Produção: I.A.L. Diamond, Doane Harrison, Billy Wilder; Música: Adolph Deutsch; Fotografia (p/b): Joseph LaShelle; Montagem: Daniel Mandell; Direcção artística: Alexandre Trauner; Decoração: Edward G. Boyle; Maquilhagem: Harry Ray, Alice Monte; Direcção de produção: Allen K. Wood; Assistentes de realização: Hal W. Polaire, Angelo Laiacona, David Salven, Mike Vidor; Departamento de arte: Tom Plews; Som: Del Harris, Fred Lau; Efeitos especiais: Milt Rice; Intérpretes: Jack Lemmon (C.C. Baxter), Shirley MacLaine (Fran Kubelik), Fred MacMurray (Jeff D. Sheldrake), Ray Walston (Joe Dobisch), Jack Kruschen (Dr. Dreyfuss), David Lewis, Hope Holiday, Joan Shawlee, Naomi Stevens, Johnny Seven, Joyce Jameson, Willard Waterman, David White, Edie Adams, Bill Baldwin, etc. Duração: 125 minutos; Distribuição em Portugal: Twentieth Century Fox (DVD); Classificação etária: M/12 anos.

JACK LEMMON (1925 – 2001)
John Uhler Lemmon III, de seu nome próprio, Jack Lemmon como nome artístico, nasceu a 8 de Fevereiro de 1925, em Newton, Massachusetts, EUA, e viria a falecer a 27 de Junho de 2001, em Los Angeles, Califórnia, EUA, vítima de cancro. Filho de uma família abastada, Jack Lemmon estudou em colégios particulares nos EUA e teve um primeiro contacto com o teatro ainda na escola, ao substituir um colega com poucas deixas. Mesmo assim, conseguiu transformar a substituição num tremendo fracasso, esquecia-se de tudo o que tinha a dizer e recolhia envergonhado aos bastidores, perante as gargalhadas do público. O insucesso não o inibiu e, pelo contrário, fê-lo apaixonar-se pela arte dramática. Continuou a representar, enquanto concluía um curso de Ciências Políticas em Harvard. Depois de servir na II Guerra Mundial, seguiu a carreira de actor, iniciando-se numa série televisiva “That Wonderful Guy” (1949-1950). No cinema, a sua primeira aparição, data de 1954, “It Should Happen to You”, de George Cukor. Dois anos depois, ganha o seu primeiro Oscar (ainda como actor secundário), com “Mister Roberts”, de John Ford e Mervin Le Roy. Depois, foi uma carreira de enorme sucesso, na televisão, no teatro, mas sobretudo no cinema. Trabalhou muito com Billy Wilder e com Richard Quine, em comédias inesquecíveis, e com Blake Edwards estreou-se como actor dramático, em “Days of Wines and Roses”. Morreu em 2001, com 76 anos de idade, e foi sepultado no Westwood Memorial Park, Los Angeles, Califórnia. Possui obviamente uma Estrela no Hall of Fame de Hollywood.

Dois Oscars : como Melhor Actor Secundário: 1956: “Mister Roberts”, e como Melhor Actor, em 1974: “Save the Tiger”; mais seis nomeações para Melhor Actor: “Some Like it Hot”, “Irma la Douce”, “Days of Wine and Roses”, “Tribute”, “The China Syndrome” e “Missing”. Globos de Ouro para Melhor Actor em 1960: “Some Like it Hot”; 1961: “Irma la Douce”; 1973: “Avanti!”; 2000: “Inherit the Wind”; Prémio Cecil B. DeMille em 1991 pelo conjunto da obra. BAFTAS (Inglaterra): Melhor Actor: 1959: “Some Like it Hot”; 1960: “The Apartement”; 1980: “Irma la Douce”; Festival de Cannes: 1979: Melhor Actor: “Irma la Douce”; 1982: “Missing”; Festival de Veneza: 1992: Coupe Volpi de Melhor Actor: “Glengarry”; Festival de Berlin: 1981: Urso de Prata para Melhor Actor “Tribute”.


Filmografia:
Como actor

1949: That Wonderful Guy (série de TV)

1949: Suspense (série de TV)

1949: The Philco Television Playhouse (série de TV)

1949-1950: Studio One (série de TV)

1949-1953: Kraft Television Theatre (série de TV)

1950: The Ford Theatre Hour (série de TV)

1951: The Frances Langford-Don Ameche Show (série de TV)

1951: Danger (série de TV)

1951: The Web (série de TV)

1951: Pulitzer Prize Playhouse (série de TV)

1951-1953: Armstrong Circle Theatre (série de TV)

1952: Heaven for Betsy (série de TV)

1952-1953: Robert Montgomery Presents (série de TV)

1953: CampbellPlayhouse (série de TV)

1953: Medallion Theatre (série de TV)

1953: Lux Video Theatre (série de TV)

1954: The Road of Life (série de TV)

1954: It Should Happen to You (Uma Rapariga Sem Nome), de George Cukor

1954: Phffft! (Pffft... é o Amor Que Se Evapora), de Mark Robson

1954: The Ford Television Theatre (série de TV)

1955: Mister Roberts (Mister Roberts), de John Ford e Mervin Le Roy

1955: My Sister Eileen (O Prazer é Todo Meu), de Richard Quine

1955: Three for the Show (Há Falta de Homens), de H.C. Potter

1956: Hollywood Bronc Busters, de Ralph Staub

1956: You Can't Run Away from It (Não Fugirás a Isto), de Dick Powell

1956: Ford Star Jubilee (série de TV)

1957: Fire Down Below (Fogo dos Trópicos), de Robert Parrish

1957: Operation Mad Ball (Nem Guerra, Nem Paz), de Richard Quine

1957: Zane Grey Theater (série de TV)

1957-1958: Goodyear Theatre (série de TV)

1957-1958: Alcoa Theatre (série de TV)

1957-1959: Playhouse 90 (série de TV)

1958: Bell, Book and Candle (Sortilégio de Amor), de Richard Quine

1958: Cowboy (Cowboy, Como Nasce Um Bravo), de Delmer Daves

1959: It Happened to Jane (A Viuvinha Indomável), de Richard Quine

1959: Some Like It Hot (Quanto Mais Quente, Melhor), de Billy Wilder

1960: Pepe (Pepe), de George Sidney (cameo)

1960: The Apartment (O Apartamento), de Billy Wilder

1960: Le Voyage en Ballon (Viagem em Balão), de Albert Lamorisse (narrador da versão inlgesa)

1960: The Wackiest Ship in the Army (Uma Aventura Imprevista), de Richard Murphy

1962: Days of Wine and Roses (Escravos do Vício), de Blake Edwards

1962: The Notorious Landlady (A Notável Senhoria), de Richard Quine

1963: Irma La Douce (Irma La Douce), de Billy Wilder

1963: Under the Yum Yum Tree, de David Swift

1964: Good Neighbor Sam (Empresta-me o Teu Marido), de David Swift

1965: How to Murder Your Wife (Como Matar a Sua Mulher), de Richard Quine

1965: The Great Race (A Grande Corrida à Volta do Mundo), de Blake Edwards

1966: The Fortune Cookie (Como Ganhar Um Milhão), de Billy Wilder

1967: Luv (Livra-me Desta Mulher), de Clive Donner

1968: The Odd Couple (Mal por Mal antes com Elas), de Gene Saks

1968: There Comes a Day (curta-metragem)

1969: The April Fools (Os Loucos do Amor), de Stuart Rosenberg

1970: The Out-of-Towners (A Sorte Viajou de Barco), de Arthur Hiller

1971: Kotch (Antes Que Chegue o Inverno), de Jack Lemmon (não creditado)

1972: Avanti! (Avanti! Amor à Italiana), de Billy Wilder

1972: The War Between Men and Women (A Guerra Entre Homens e Mulheres), Melville Shavelson

1973: Save the Tiger (Sonhos do Passado), de John Avildsen

1973: Get Happy (telefilme)

1974: The Front Page (A Primeira Página), de Billy Wilder

1975: The Prisoner of Second Avenue (O Prisioneiro da Segunda Avenida), de Melvin Frank

1975: The Gentleman Tramp, de Richard Patterson (narrador)

1975: La Polizia ha le Mani Legate ou Portrait of a 60% perfect, de Luciano Ercoli (narrador)

1975: Wednesday (curta-metragem)

1976: Alex & the Gypsy (Alex e a Feiticeira), de John Korty

1976: The Entertainer (telefilme)

1977: Airport'77 (Aeroporto 77), de Jerry Jameson

1979: The China Syndrome (A Síndroma da China), de James Bridges

1979: Ken Murray: Shooting Stars, de Ken Murray

1980: Tribute (A Homenagem), de Bob Clark

1981: Buddy Buddy (Os Amigos da Onça), de Billy Wilder

1981: Musical Comedy Tonight II (telefilme)

1982: Missing (Missing - Desaparecido), de Costa-Gavras

1982: Ernie Kovacs: Television's Original Genius (telefilme)

1984: Mass Appeal (telefilme)

1986: That's Life! (A Vida é Assim), de Blake Edwards

1986: Macaroni, de Ettore Scola

1987: Long Day's Journey into Night (telefilme)

1988: The Murder of Mary Phagan (telefilme)

1989: Dad (Meu Pai), de Gary David Goldberg

1991: JFK (JFK), de Oliver Stone

1992: Glengarry Glen Ross (Sucesso a Qualquer Preço), de James Foley

1992: The Player (O Jogador), de Robert Altman

1992: For Richer, for Poorer, de Jay Sandrich (telefilme)

1993: Grumpy Old Men (Como Pescar Uma Italiana Sem Partir a Cana Poster), de Donald Petrie

1993: Short Cuts (Short Cuts — Os Americanos), de Robert Altman

1993: Luck, Trust & Ketchup: Robert Altman in Carver Country, de John Dorr

1993: A Life in the Theater (telefilme)

1995: Grumpier Old Men (Dois Novos Rabugentos), de Howard Deutch

1995: The Grass Harp, de Charles Matthau

1996: Hamlet (Hamlet), de Kenneth Branagh

1996: My Fellow Americans (Politicamente... Incorrecto!), de Peter Segal

1996: A Weekend in the Country (Um Fim-de-Semana no Campo) (telefilme)

1996: Getting Away with Murder (Crime com Castigo), de Harvey Miller

1997: Out to Sea (Mais Olhos Que Barriga), de Martha Coolidge

1997: 12 Angry Men (telefilme)

1997: Puppies for Sale (curta-metragem)

1997: Os Simpsons (série de TV)

1997: Off the Menu: The Last Days of Chasen's, de Shari Springer Berman e Robert Pulcini

1998: The Odd Couple II (), de Howard Deutch

1998: The Long Way Home (telefilme)

1999: Inherit the Wind (telefilme)

1999: Tuesdays with Morrie, de de Mick Jackson (telefilme)

1999: Chicken Soup for the Soul (série de TV)

2000: The Legend of Bagger Vance (A Lenda de Bagger Vance), de Robert Redford (narrador)


Como realizador:

1971: Kotch (Antes Que Chegue o Inverno)


SHIRLEY MACLAINE
(1934 - ?)
Shirley MacLaine, cujo nome de baptismo é Shirley MacLean Beaty, nasceu a 24 de Abril de 1934, em Richmond, Virginia, EUA. Filha de Ira Owens Beaty, um músico de origem irlandesa, e de Kathlyn Corinne MacLean, bailarina canadiana; irmã do actor e realizador Warren Beatty; casada, desde 1954 até 1982, com o realizador e produtor Steve Parker, Shirley iniciou-se como aluna de bailado na Washington School of Ballet. Diplomada, passou a viver em Nova Iorque, onde começa a aparecer em musicais da Broadway, como no sucesso de Richard Rodgers e Oscar Hammerstein II, "Me and Juliet" e, seguidamente, em "The Pajama Game", sendo posteriormente convidada pelo produtor Hal B. Wallis para viajar até Hollywood, onde se estreia em “O Terceiro Tiro”, de Alfred Hitchcock (1955). Surge noutros filmes, como na superprodução “A Volta ao Mundo em Oitenta Dias” (1956), ou no excelente “Deus Sabe Quanto Amei”, de Minnelli (1958), onde recebe a primeira nomeação para o Oscar de Melhor Actriz. Em 1960, volta a ser nomeada por “O Apartamento”, e pouco depois, terceira nomeação por “Irma la Douce” (1963). In 1969, dirigida pelo amigo Bob Fosse, interpreta um musical, “Sweet Charity - A Rapariga que Queria Ser Amada”, Estreia-se como realizadora em 1975, com um documentário, rodado na China, “ The Other Half of the Sky: A China Memoir”, que é nomeado para o Oscar da categoria. Como actriz, nova nomeação em 1977, com “A Grande Decisão”. Finalmente ganha o Oscar de Melhor Actriz com “Laços de Ternura” (1983), e arrebata o Festival de Veneza com “Madame Sousatzka, a Professora” (1988). Depois de muitos outros sucessos, regressa à realização em 1998, com uma ficção, “Bruno” (2000). Entretanto, apareceu em diversas séries de televisão e telefilmes. Em 2012 tem em pré-produção vários trabalhos. Shirley conta com uma Estrela no Hall of Fame, de Hollywood, em 1615 Vine Street.

Filmografia:

Cinema


1955: The Trouble with Harry (O Terceiro Tiro), de Alfred Hitchcock

1955: Artists and Models (Pintores e Raparigas), de Frank Tashlin

1956: Around the World in Eighty Days (A Volta ao Mundo em 80 Dias), de Michael Anderson

1958: The Sheepman (O Irresistível Forasteiro), de George Marshall

1958: The Matchmaker (Viva o Casamento), de Joseph Anthony

1958: Hot Spell (Feitiço Ardente), de Daniel Mann

1958: Some Came Running (Deus Sabe Quanto Amei), de Vincente Minnelli

1959: Ask Any Girl (O Que Elas Querem é Casar), de Charles Walters

1959: Career (Os Caminhos da Ambição), de Joseph Anthony

1960: Can-Can (Can-Can), de Walter Lang

1960: The Apartment (O Apartamento), de Billy Wilder

1960: Ocean's Eleven (Os Onze de Oceano), de Lewis Milestone

1961: All in a Night's Work (A História daquela Noite), de Joseph Anthony

1961: Two Loves (Dois Amores), de Charles Walters

1961: The Children's Hour (A Infame Mentira), de William Wyler

1962: My Geisha (A Minha Gueixa), de Jack Cardiff

1962: Two for the Seesaw (Baloiço Para Dois), de Robert Wise

1963: Irma la douce (Irma la Douce), de Billy Wilder

1964: What a Way to Go ! (Ela e os Seus Maridos), de J. Lee Thompson

1964: The Yellow Rolls-Royce (O Rolls-Royce Amarelo), de Anthony Asquith

1965: John Goldfarb, Please Come Home (Um Americano no Harém), de J. Lee Thompson

1966: Gambit (Ladrão Roubado), de Ronald Neame

1967: Woman Times Seven (Sete Vezes Mulher), de Vittorio de Sica

1968: The Bliss of Mrs. Blossom (A Felicidade da Senhora Blossom), de Joseph McGrath

1969: Sweet Charity (Sweet Charity - A Rapariga que Queria Ser Amada), de Bob Fosse

1970: Two Mules for Sister Sara (Os Abutres Têm Fome), de Don Siegel

1971: Desperate Characters (Um Casal Desesperado), de Frank D. Gilroy

1972: The Possession of Joel Delaney (A Obsessão de Joel Delaney), de Waris Hussein

1977: The Turning Point (A Grande Decisão), de Herbert Ross

1979: Being There (Bem-Vindo Mr. Chance), de Hal Ashby

1980: Loving Couples (Amigos e Amantes), de Jack Smight

1980: A Change of Seasons (A Aluna e o Professor), de Richard Lang

1983: Terms of Endearment (Laços de Ternura), de James L. Brooks

1984: Cannonball Run II (A Corrida Mais Louca do Mundo II), de Hal Needham

1988: Madame Sousatzka (Madame Sousatzka, a Professora), de John Schlesinger

1989: Steel Magnolias (Flores de Aço), de Herbert Ross

1990: Waiting for the Light, de Christopher Monger

1990: Postcards from the Edge (Recordações de Hollywood), de Mike Nichols

1992: Used People (Um Certo Outono), de Beeban Kidron

1993: Wrestling Ernest Hemingway), de Randa Haines

1994: Guarding Tess (O Agente Secreto), de Hugh Wilson

1996: Mrs. Winterbourne (O Comboio do Destino), de Richard Benjamin

1996: The Evening Star (Lágrimas ao Entardecer), de Robert Harling

1997: A Smile Like Yours (Bebé por Encomenda), de Keith Samples

2000: Bruno, de Shirley MacLaine

2003: Carolina, de Marleen Gorris

2005: Bewitched (Casei com uma Feiticeira), de Nora Ephron

2005: In Her Shoes (Na Sua Pele), de Curtis Hanson

2005: Rumor Has It (Dizem por Aí...), de Rob Reiner

2007: Closing the Ring (O Elo do Amor), de Richard Attenborough

2010: Valentine's Day (Dia dos Namorados), de Garry Marshall

2011: Anyone's Son (Morre... e Deixa-me em Paz), de Danny Aiello

2012: Bernie, de Richard Linklater

2012: Wild Oats

2013: Mother Goose! (em pré-produção)

2013: The Boom Boom Room (em pré-produção)

2013: Elsa & Fred (em pré-produção)

2013: The Locals (em pré-produção)

2013: The Secret Life of Walter Mitty (em pré-produção)


Televisão :

1955: Shower of Stars (série de TV)

1958: The Sid Caesar Show (série de TV)

1971-1972: Shirley's World, de Ray Austin(série de TV)

1995: The West Side Waltz (A Valsa da Vida), de Ernest Thompson (telefilme)

1998: Stories from My Childhood (série de TV)

1999: Joan of Arc (Joana de Arc - A Donzela da Lorena), de Christian Duguay (telefilme)

2001: These Old Broads, de Matthew Diamond (telefilme)

2002: Hell on Heels: The Battle of Mary Kay, de Ed Gernon (telefilme)

2002: Salem Witch Trials, de Joseph Sargent (telefilme)

2008: Coco Chanel, de Christian Duguay (telefilme)

2008: Anne of Green Gables: A New Beginning, de Kevin Sullivan (telefilme)

2012: Downton Abbey, de Julian Fellowes (série de TV)


Comorealizadora:

1975: The Other Half of the Sky: A China Memoir (documentário)

2000: Bruno

SESSÃO EXTRA: 20 DE OUTUBRO DE 2014

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"VERTIGO” O MELHOR FILME DE SEMPRE?

“Sight & Sound” é uma revista inglesa de critica cinematográfica que apareceu em 1932, passando a partir de 1934 a ser editada pelo BFI (British Film Institute).  A revista mantem-se ainda hoje como uma das publicações mais prestigiadas em todo o mundo.  De edição mensal, dá igual importância a obras de grade público e de circuitos restritos, sendo dirigida por Gavin Lambert entre 1949 e 1955, depois, de 1956 a 1990, por Penelope Houston. Actualmente é da responsabilidade de Nick James.
Em 1952, a “Sight & Sound” organizou um primeiro inquérito entre críticos, realizadores, historiadores, académicos e distribuidores de todo o mundo, solicitando a cada um dele a sua lista dos 10 Melhores Filmes de Sempre. Do computo geral saiu uma lista que tinha à frente “Ladrões de Bicicletas”, de Vittorio de Sica, e uma maioria de obras do cinema mudo: 1. Bicycle Thieves (25 votos), 2. City Lights (19), 2. The Gold Rush (19), 4. Battleship Potemkin (16), 5. Intolerance (12), 5. Louisiana Story (12), 7. Greed (11), 7. Le Jour se Leve (11), 7. The Passion of Joan of Arc (11), 10. Brief Encounter (10), 10. La Règle du Jeu (10) e 10. Le Million (10).
Dez anos depois, a revista repetiu o inquérito com resultados bastante diferente. “Citizen Kane”, de Orson Welles, aparecia à frente: 1. Citizen Kane (22 votos), 2. L'Avventura (20), 3. La Règle du Jeu (19), 4. Greed (17), 4. Ugetsu Monogatari (17), 6. Battleship Potemkin (16), 7. Bicycle Thieves (16), 7. Ivan the Terrible (16), 9. La Terra Trema (14) e 10. L'Atalante (13).
Em 1972, novo inquérito dava outro resultado, mantendo todavia “Citizen Kane” na dianteira:
1. Citizen Kane (32 votos), 2. La Règle du Jeu (28), 3. Battleship Potemkin (16), 4. 8½ (15), 5. L'Avventura (12), 5. Persona (12), 7. The Passion of Joan of Arc (11), 8. The General (10), 8. The Magnificent Ambersons (10), 10. Ugetsu Monogatari (9) e 10. Wild Strawberries (9).
Nova década passou e, em 1982, a votação sofreu algumas alterações, mas Welles manteve-se na dianteira: 1. Citizen Kane (45 votos), 2. La Règle du Jeu (31), 3. Seven Samurai (15), 3. Singin' in the Rain (15), 5. 8½ (14), 6. Battleship Potemkin (13), 7. L'Avventura (12), 7. The Magnificent Ambersons (12), 7. Vertigo (12), 10. The General (11) e 10. The Searchers (11). Não deixa de ser interessante verificar as alterações. Alguns títulos foram desaparecendo, outros surgindo, alguns subindo ou descendo em virtude do “gosto” da época.
Em 1992, a iniciativa manteve-se e o primeiro lugar também: 1. Citizen Kane (43 votos), 2. La Règle du Jeu (32), 3. Tokyo Story (22), 4. Vertigo (18), 5. The Searchers (17), 6. L'Atalante (15), 6. The Passion of Joan of Arc (15), 6. Pather Panchali (15), 6. Battleship Potemkin (15) e 10. 2001: A Space Odyssey (14).
No primeiro inquérito do século XXI (2002), “Vertigo” começa a ameaçar “Citizen Kane” que todaia mantem a hegemonia durante 50 anos: 1. Citizen Kane (46 votos), 2. Vertigo (41), 3. La Règle du Jeu (30),4. The Godfather e The Godfather Part II (23), 5. Tokyo Story (22), 6. 2001: A Space Odyssey (21), 7. Battleship Potemkin (19), 7. Sunrise: A Song of Two Humans (19), 9. 8½ (18) e 10. Singin' in the Rain (17).
Em 2012, finalmente, a reviravolta: “Vertigo” em primeiro lugar, “O Mundo a Seus Pés” em segundo. Entretanto o universo de votantes também se alterou consideravelmente em numero: 846 críticos, programadores, académicos e distribuidores, notando a ausência de realizadores que agora tinham uma votação à parte. Os resultados: Vertigo (191 votos), 2. Citizen Kane (157), 3. Tokyo Story (107), 4. La Règle du Jeu (100), 5. Sunrise: A Song of Two Humans (93), 6. 2001: A Space Odyssey (90), 7. The Searchers (78), 8. Man with a Movie Camera (68), 9. The Passion of Joan of Arc (65) e 10. 8½ (64).
A “Sight & Sound” desde 92 que mantem um votação isolada para realizadores, com resultados bastante diferentes nalguns aspectos. Em 1992: 1. Citizen Kane, 2. 8½, 3. Raging Bull, 4. La Strada, 5. L'Atalante, 6. The Godfather, 6. Modern Times, 6. Vertigo, 9. The Godfather Part II, 10. The Passion of Joan of Arc, 10. Rashomon e 10. Seven Samurai;
Em 2002: 1. Citizen Kane; 2. The Godfather e The Godfather Part II, 3. 8½, 4. Lawrence of Arabia, 5. Dr. Strangelove, 6. Bicycle Thieves, 6. Raging Bull, 6. Vertigo, 9. Rashomon, 9. La Règle du Jeu, 9. Seven Samurai; Finalmente em 2012 os resultados também diferiram da lista mais vasta: 1. Tokyo Story (48 votos), 2. 2001: A Space Odyssey (42), 3. Citizen Kane (42), 4. 8½ (40), 5. Taxi Driver (34), 6. Apocalypse Now (33), 7. The Godfather (31), 07. Vertigo (31),
9. The Mirror (30) e 10. Bicycle Thieves (29).
Até agora esteve a falar-se sobretudo de filmes de ficção (com uma ou outra excepção documental). Em 2014 a “Sight & Sound” realizou um inquérito sobre os Melhores Documentários de Sempre. Por curiosidade aqui ficam os resultados: 1. Man with a Movie Camera (100 votos), 2. Shoah (68), 3. Sans Soleil (62), 4. Night and Fog (56), 5. The Thin Blue Line (49), 6. Chronicle of a Summer (32), 7. Nanook of the North (31), 8. The Gleaners and I (27), 9. Dont Look Back (25) e 9. Grey Gardens (25).
Voltando a “Vertigo” e ao seu primeiro lugar em 2012, há que referir que a sua foi uma subida gradual, durante os últimos decénios, desde o sétimo lugar em 1998, passando por um quarto (2000), por um segundo (2002) para alcançar o topo da pirâmide em 2012. Esta progressiva subida quer dizer alguma coisa de consistente: o filme foi cada vez mais apreciado sem dúvida. Mas, por outro lado, estes inquéritos comportam uma percentagem de incerteza muito grande quanto aos resultados. Primeiro que tudo há que avaliar o universo de convidados a votar. Se forem todos escolhidos em função de uma certa tendência estética ou geográfica, os resultados não podem ser consistentes. E sabe-se muito bem como se podem influenciar as conclusões, escolhendo sabiamente as premissas. Depois, as listas não são analisadas em função das preferências no interior de cada votante. Muito pelo contrario: cada filme é um voto e é da soma dos votos que sai o resultado final. Mas, qualquer que sejam as dúvidas, são interessantes e esclarecedores os desfechos. Se será ou não o Melhor Filme de Sempre (ao cair do ano de 2012), não importa muito. É seguramente um dos Melhores Filmes de Sempre, o que já importa bastante. Para mim, já agora como nota pessoal, nunca o colocaria sequer entre os meus Dez Melhores. O que não invalida que o considere uma obra-prima inquestionável.

A MULHER QUE VIVEU DUAS VEZES


Consta que Alfred Hitchcock gostaria muito de adaptar ao cinema “Celle qui n'Était Plus”, um romance da dupla francesa, Pierre Boileau e Thomas Narcejac, entretanto adaptado em França, em 1955, por Henri-Georges Clouzot, com o título “Les Diaboliques”. Sabendo do interesse do realizador norte-americano, Boileau e Narcejac resolveram escrever um novo romance, "D'Entre les Morts", que enviaram a Hitch. Assim nasce “Vertigo, que conta com o trabalho de Alec Coppel e Samuel A. Taylor na escrita do guião, com a colaboração, não referenciada no genérico do escritor e dramaturgo Maxwell Anderson.
Extremamente original quando foi rodado, na forma como desenvole a narrativa e nos processos técnicos utilizados (muitas vezes repetidos e copiados posteriormente, o que pode dar a sensação hoje em dia de não ser tão original quanto o foi em 1957), “A Mulher que Viveu Duas Vezes” é uma obra extremamente complexa, jogando com alguns dos temas caros a Hitchock. Um deles é a obsessão da culpa, outro a presença de uma loura capitosa, que oscila entre vítima indefesa e mulher fatal, um terceiro o recurso à psicanalise e aos complexos e pulsões eróticas desencadeados pelas teorias de Freud e continuadores, muito em voga por esses anos no cinema norte-americano. 

John Ferguson (o sempre notável James Stewart) é um polícia reformado, que sente a culpa de estar ligado à morte de um companheiro de equipa que, ao longo de uma perseguição pelos telhados de São Francisco, ao tentar salvá-lo de uma queda, acaba por sucumbir ele próprio no precipício. Ferguson não sente só a culpa desse acidente, como também fica refém de uma acrofobia que o impede de se aproximar de qualquer abismo, sofrendo de terríveis vertigens que lhe tolhem os movimentos e provocam o desmaio e a queda. Vive a tentar recuperar do trauma, na companhia de Midge Wood (a admirável Barbara Bel Geddes), uma designer que se apresenta como a imagem protectora e maternal de uma amiga e serena apaixonada que lhe dá a força necessária em momentos de maior inquietação. Um dia Ferguson recebe a proposta de um antigo amigo, Gavin Elster (Tom Helmore), para reatar a sua actividade, agora como detective particular. A ideia é perseguir Madeleine Elster (a belíssima Kim Novak), mulher de Gavin, que atravessa um período conturbado, julgando assumir a personalidade de uma antiga antepassada que se matara. Gavin afirma temer pela sorte da mulher e quere-a acompanhada ao longo do dia, antecipando alguma tragédia. Fergunson acaba por aceitar a incumbência e a beleza de Madeleine e o mistério que a cerca acabarão por enfeitiçar o ex-polícia. É difícil ir mais além a desenhar os contornos da trama sem lhe retirar suspense, o que num filme do mestre do mesmo, seria indesculpável. 
Mas pode dizer-se que Fergunson não se liberta da sua acrofobia, e que alguém se aproveita dela para tentar cometer o crime prefeito. Pode ainda falar-se de uma obsessão amorosa que fulgurantemente galopa, e não se andará muito longe da verdade se se analisar, a certa altura do enredo, o comportamento de Fergunson que se aproxima muito de um sintomático pigmaleanismo, procurando recriar a mulher dos seus sonhos. Aliás a revisitação de alguns temas mitológicos clássicos e de alguns sonhos freudianos(há mesmo um pesadelo visual de Fergunson que revela alguma influência surrealista, sob a batuta de mestre Saul Bass) ao longo de toda a obra que conta ainda com uma curiosa construção cromática, com alguns planos a viragem para um monocromatismo muito interessante de um ponto de vista simbólico, mas sobretudo como efeitos dramáticos conseguidos mercê com mão de mestre pela astúcia formal de Hitch. 


De um ponto de vista plástico a obra é de uma elegância e de um beleza sufocantes, uma das mais rigorosas e perfeitas saídas deste genial manipulador de emoções. Há um efeito que começou desde então a ser conhecido como “a vertigem Hitchcock” e através do qual o cineasta consegue o efeito de vertigem conjugando um travelling manual recuando, com um zoom óptico de aproximação. Mas esta é apenas uma das originalidades desta obra-prima que, todavia, na noite da atribuição dos Oscars desse ano, apenas se viu distinguida com duas nomeações para Melhor Direcção Artística e Melhor Som, e nem estas haveria de ganhar. Aliás, a recepção do público na época da estreia, foi razoavelmente boa, bem como a da crítica, sem todavia entusiasmar quem quer que seja. O título só começou a ser devidamente valorizado a partir da década de 70, quando alguns realizadores (entre os quais Martin Scorsese e Brian De Palma), muito influenciados pela critica europeia, lhe atribuíram um outro valor. Mas foi definitivamente depois d restauro, em 1996, que a obra saltou para os lugares de topo das listas dos Melhores de Sempre.
“A Mulher Que Viveu Duas Vezes” não é curiosamente o filme preferido de Hitch (chegou a confessar que uma das suas obras preferidas era “Shadow of a Doubt” - A Sombra de Uma Dúvida-, de 1943), mas, igualmente segundo as suas próprias palavras terá sido “o seu filme mais pessoal”, onde a protagonista pode considerar-se a representação das mulheres na vida de Alfred Hitchcock.

A MULHER QUE VIVEU DUAS VEZES
Título original: Vertigo

Realização: Alfred Hitchcock (EUA, 1958); Argumento: Alec Coppel, Samuel A. Taylor, segundo romance de Pierre Boileau  e Thomas Narcejac ("D'Entre Les Morts"), como colaboração não creditado de Maxwell Anderson; Produção: Herbert Coleman, Alfred Hitchcock; Música: Bernard Herrmann; Fotografia (cor):  Robert Burks; Montagem: George Tomasini; Casting: Bert McKay; Direcção artística: Henry Bumstead, Hal Pereira; Decoração:  Sam Comer, Frank R. McKelvy; Guarda-roupa:  Edith Head; Maquilhagem: Nellie Manley, Wally Westmore;  Direcção de Produção:  Frank Caffey, Andrew J. Durkus, C.O. Erickson, Don Robb;  Assistentes de realização: Daniel McCauley; Departamento de arte: Saul Bass (poster e genérico), Gene Lauritzen, Manlio Sarra (retrato de Carlota); Som: Winston H. Leverett, Harold Lewis;  Efeitos visuais: Farciot Edouart, John P. Fulton, W. Wallace Kelley, Paul K. Lerpae, John Whitney Sr.; Companhias de produção: Paramount Pictures, Alfred J. Hitchcock Productions; Intérpretes: James Stewart (John 'Scottie' Ferguson), Kim Novak (Madeleine Elster / Judy Barton), Barbara Bel Geddes (Midge Wood), Tom Helmore (Gavin Elster), Henry Jones (Coroner), Raymond Bailey  (médico de Scottie), Ellen Corby (gerente do McKittrick Hotel), Konstantin Shayne (Pop Leibel), Lee Patrick, David Ahdar, Isabel Analla, Jack Ano, Margaret Bacon, John Benson, Danny Borzage, Margaret Brayton, Paul Bryar, Steve Conte, Jean Corbett, Bruno Della Santina, Roxann Delman, Molly Dodd, Bess Flowers, Joe Garcio, Joanne Genthon, Don Giovanni, Roland Gotti, Victor Gotti, Fred Graham, Robert Haines, Buck Harrington, Alfred Hitchcock (homem a passear na rua, aos 11 minutos do filme), Jimmie Horan, Art Howard, Catherine Howard, June Jocelyn,  David McElhatton, Miliza Milo, Lyle Moraine, Forbes Murray, Julian Petruzzi, Ezelle Poule,  Kathy Reed, William Remick, Jack Richardson, Jeffrey Sayre, Nina Shipman, Dori Simmons, Ed Stevlingson, Sara Taft, etc. Duração: 129 minutos; Distribuição em Portugal: Midas Filmes; Classificação etária: M/ 12 anos; Data de estreia em Portugal: 13 de Janeiro de 1959. 
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